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Jogos por assinatura vão matar os AAA?

A indústria precisa mesmo temer o acesso de jogos via streaming?

por Jean Azevedo
Jogos por assinatura vão matar os AAA?

O avanço da tecnologia impacta cada vez mais na maneira como consumimos conteúdo, e isso não é diferente quando o assunto são os nossos tão amados jogos. A abordagem da indústria teve de se adequar às praticidades dos dispositivos mobile e já consegue explorar bem conexões de internet mais estáveis para levar entretenimento.

As plataformas de streaming, que também mudaram a forma de acompanharmos nossos shows e séries favoritas, já chegaram aos videogames. Os serviços apresentam uma variedade de títulos, e dependendo do aparelho, pode ser algo bem vantajoso aos assinantes.

Neste especial do Clube MeuPS, abordaremos diretamente a relação entre os jogos por assinatura via streaming com os de grande porte e alto investimento. A questão engloba tanto o retorno financeiro quanto o engajamento dos jogadores em cada uma das ofertas presentes no mercado.

Por que os jogos por assinatura estão dando certo?

Multiplataforma

A praticidade em poder usufruir de seus jogos preferidos em múltiplas plataformas é algo atrativo para o público de acordo com a pesquisa levantada pela Deloitte Insights. Nem todos os jogadores de console mantiveram seus videogames como principal dispositivo para se divertir e aproveitam os conteúdos tanto no PC quanto em aparelhos mobile.

Jogos por assinatura vão matar os AAA? - Gráfico de uso dos aparelhos mobile, consoles e PC
Gráfico representando o uso dos dispositivos pelos usuários (Fonte: Reprodução/ DELLOITE INSIGHTS)
Tipos de jogadores de acordo com a plataforma - Jogos por assinatura vão matar os AAA?
No geral, a audiência nos smartphones se destaca (Fonte: Reprodução/DELLOITE INSIGHTS)

Os dados correspondem ao período de 2015 a 2018, porém, na mais recente Pesquisa Game Brasil de 2021, constatou-se que 41,6% dos jogadores brasileiros vêem nos smartphones, graças à sua portabilidade, o lugar preferido para “gastar” um tempinho jogando.

O PS Now e o Game Pass, por exemplo, podem ser acessados através do PC. Sendo assim, títulos como God of War e Bloodborne, já figuraram no serviço da Sony e estiveram temporariamente jogáveis em outros hardwares.

Talvez seja exatamente neste quesito onde a Apple e a Nintendo devam explorar uma melhora por contarem com catálogos de respeito mas com disponibilidade mais direcionada. A EA, uma das pioneiras no sistema, atende a grande parte das plataformas citadas.

Preço Acessível

O preço para ter acesso aos serviços é um dos principais atrativos. Mais acessíveis em comparação à cobrança praticada em títulos digitais, mesmo nos de menor porte, os catálogos são amplos e correspondem à expectativa de muitos perfis de jogadores.

Biblioteca Extensa

A quantidade de games acaba atendendo a muitos públicos de forma diversa. Os jogadores mais casuais contam com muitas possibilidades para se divertir e os que curtem desfrutar de jogos mais elaborados, quando disponíveis, também são beneficiados.

Por que os AAA são um sucesso?

Experiência Diferenciada

A expectativa em torno de um título com alto investimento sempre é alta. Games AAA levam um tempo maior para serem desenvolvidos e são mais elaborados com relação aos gráficos, mecânicas e enredo.

Varios jogos do PlayStation Studios.

Sempre aguardamos obras memoráveis quando envolvem o nome do PlayStation Studios e o principal foco da companhia é continuar mantendo o padrão em seus lançamentos. Nas últimas declarações de Jim Ryan (Diretor Executivo da SIE) e Hermen Hulst (Chefe do PS Studios) a visão fica bem clara quando se trata de produções de grande porte: teremos mais, e da melhor qualidade.

Narrativa e Jogabilidade

Dois dos elementos mais bem trabalhados em títulos desse tipo são a narrativa e a jogabilidade.

The Last of Us Part II

O casamento perfeito e uma fórmula mágica para qualquer produção é a imersão causada pela identificação com os personagens ou acontecimentos e a forma com que o jogador interage e participa dos eventos.

Hype

God of War: Ragnarok - simbolo do novo god of war

A cultura de promover o hype, mesmo desnecessariamente alto, em games AAA passou a ser algo inevitável e perigoso. 

Os destaques da E3 2021 giraram em torno de publishers com projetos ambiciosos: Forza, Elden Ring, Avatar e Guardiões da Galáxia foram alguns dos nomes em evidência no final da conferência, simplesmente por que aguardamos gráficos, jogabilidade e narrativas de alta qualidade.

Os perigos que os jogos por assinatura apresentam

Falar sobre os jogos por assinatura no momento não necessariamente engloba a questão do Game Pass contar com grande apelo da comunidade ou do PlayStation Now estar ou não disponível no Brasil. Vai muito além inclusive da Sony planejar um contra-ataque ao já sucedido serviço do Xbox, a disputa não é entre plataformas, é uma novidade capaz de afetar a indústria a longo prazo e mudar a maneira com que nos divertimos jogando.

Grandes atualizações no consumo de conteúdo moldam as empresas, e quem não se adapta acaba ficando de fora. Os analistas, desenvolvedores e o próprio Jim Ryan, chefe da PlayStation, já comentaram sobre o assunto abertamente. O futuro dos games está se firmando em torno de conexões mais potentes e na dinamicidade dos dispositivos, o que leva os jogadores a se afastarem um pouco dos consoles.

O streaming de jogos, de acordo com Mat Piscatella, analista do renomado NPD Group, pode ser prejudicial ao modelo atual devido pelo seguinte motivo:

Apostar alto nas assinaturas e streaming traz uma enorme oportunidade em termos globais, particularmente em mercados menos desenvolvidos em termos de games. Mas não posso deixar de ver o risco da desvalorização dos conteúdos em mercados gaming mais maduros como os Estados Unidos, onde 71% da população já joga videogames.

A praticidade de acessar os seus títulos preferidos em um dispositivo mobile também é um ponto a se levar em conta. Naoki Yoshida, produtor de Final Fantasy, vê o fim dos jogos dedicados aos consoles a longo-prazo graças aos smartphones e consoles portáteis.

A realidade já foi mencionada anteriormente neste artigo, visto que uma grande parcela dos brasileiros já mesclam sua jogatina nos dois ambientes:

Quando o 5G se tornar um padrão mundial, chegará o momento no qual poderemos transmitir imagens para qualquer aparelho. Os jogadores poderão desfrutar de uma jogatina de alta qualidade em qualquer dispositivo sem estarem atados a hardwares ou monitores de TV. Nós definitivamente estamos indo nesta direção e a pandemia não vai desacelerar essa mudança.

Jim Ryan captou a preocupação da comunidade com a iminente predominância do formato por streaming dos jogos. Porém, apesar da comunidade encarar a novidade como algo ameaçador, o chefe enxerga uma oportunidade em um meio bastante representativo para a geração atual:

Jim Ryan, CEO da PlayStation, discursando de terno e gravata no palco de algum evento de games.

É da natureza humana encarar as transformações como nocivas, mas é uma oportunidade [de crescimento]. Eu aponto o fato da transição da distribuição de jogos físicos para os digitais ter sido um grande responsável por termos construído uma comunidade de 100 milhões de pessoas nessa geração. Essa mudança, do físico para o digital, foi vista com ansiedade e receio há 6 anos. No entanto, o impacto da transição foi divino.

Na época da declaração, a Sony já ajustava o PlayStation Now com um preço mais acessível e reformulações mais severas no sistema. O resultado naquele novembro de 2019? Aumento de 50% dos assinantes no serviço em apenas 30 dias.

Estamos levando isso muito a sério. Assumimos o compromisso em reduzir o preço, investir em conteúdo, realizar campanhas. São exemplos de como estamos comprometidos.

Modelo por streaming é mais seguro financeiramente

O modelo de jogos por assinatura é mais seguro devido à previsibilidade do lucro do serviço. O número de assinantes apresenta às empresas qual o lucro estimado dentro de determinado período e daí as demais metas são traçadas.

De acordo com o portal Vindi, com a cobrança recorrente, o faturamento fica ainda mais controlável com a possibilidade dos planos trimestrais, semestrais e anuais. Tendo esses números em mãos, dificilmente atitudes de risco serão tomadas, e esse é um diferencial e tanto para os AAA.

Alto investimento garante retorno?

Nada de citar Cyberpunk 2077 e seu conturbado lançamento ao falar da descontinuidade de um AAA. Mesmo obtendo sucesso e apelo por parte do público, nada assegura que uma sequência ou mais conteúdo dedicado ao título seja realmente lançado.

Em uma declaração polêmica, mas que acabou ganhando importância dentre os fãs da marca PlayStation, e principalmente entre os amantes de Days Gone, Jeff Ross, ex- SIE Bend Studio, comentou o fato da Sony “sobreviver a cada geração” e não poder cometer erros na produção de grandes jogos.

Deacon, protagonista de Days Gone, da Bend Studio, de joelhos em uma estrada chuvosa com uma moto tombada e lobos mortos.

Em resumo, mesmo com o sucesso de vendas do título, o orçamento final para a produção de uma sequência do game seria ainda maior. 

A Sony precisa gerir com responsabilidade. Não é errado tomar decisões baseadas na previsão de retorno do investimento pois precisam dessa receita para a produção do próximo jogo.

O acontecimento desencadeou uma série de reações por parte dos jogadores e dos envolvidos no desenvolvimento da aventura de Deacon St. John. O principal fator, segundo a imprensa, foi o longo tempo de desenvolvimento e a recepção mista por parte da crítica. Days Gone 2 seria um AAA de risco na visão da gigante japonesa de acordo com a interpretação dos cenários.

Para garantir esse retorno no investimento, a fórmula é simples: produzir os melhores jogos, nada de títulos “ok”. Essas foram as palavras do dono da porra toda, Jim Ryan, em sua mais recente aparição na qual tocou no assunto dos renomados exclusivos do PlayStation Studios:

Pessoas como eu precisam manter duas coisas em mente e se lembrar que é melhor esperar e contar com um grande título do que apressar e lançar um produto “ok” ou quase bom. Os jogadores só se lembram dos melhores jogos ao invés dos demais. 

Se é uma grande obra, os players podem pedir uma sequência e vão adquiri-la, mas isso ninguém se importará se for um jogo qualquer. É claro, devido ao investimento e considerações no portfólio nós também exercemos pressão para certos games serem entregues no prazo.

Mas no geral, não queremos títulos médios, queremos os melhores.

Afinal, os jogos por assinatura vão matar os AAA?

A resposta mais racional no momento é: eles podem coexistir. Dois acontecimentos recentes exemplificam bem isso: a expansão da marca PlayStation e os títulos mais acessados do PS Now, que será fortalecido em breve.

A Sony já está se preparando para o futuro. A chegada de Horizon Zero Dawn, Days Gone e outros possíveis títulos em um futuro próximo são um pequeno passo. A visão da empresa em expandir seus AAA para os smartphones também aumenta o portfolio de atuação da gigante japonesa, o chefão da PlayStation disse o seguinte:

Nós estivemos pensando na maneira com a qual os nossos jogadores aproveitam nosso conteúdo e tivemos um pequeno sucesso no experimento com jogos do PlayStation para a plataforma mobile e aplicativos que geram mais escolhas. Esse é apenas uma das áreas que queremos explorar para chegar a milhões de jogadores através de nossas plataformas.

Como mencionado no primeiro tópico deste artigo, a possibilidade de acessar os títulos do serviço em demais plataformas são um dos principais atrativos nesse tipo de serviço. O catálogo de jogos por assinatura fica ainda melhor com grandes títulos disponíveis.

Falando sobre os jogos mais acessados no PS Now (divulgados em junho), a listagem é a seguinte:

Títulos mais jogados do PS Now no PS4 e PS5

  1. Marvel’s Avengers (disponível até 5 de julho)
  2. Horizon Zero Dawn
  3. Call of Duty: Black Ops III (esteve disponível até 29 de abril)
  4. F1 2020 (não disponível no Japão)
  5. WWE 2K19

Títulos mais jogados do PS Now no PC

  1. Bloodborne
  2. Horizon Zero Dawn
  3. The Last of Us
  4. Marvel’s Avengers
  5. Detroit: Become Human

Os títulos AAA, mesmo que listados no serviço bastante tempo depois de lançados, se destacam em um serviço por assinatura. A rotatividade dos mesmos pode inclusive impactar na quantidade de assinantes por um breve período.

A estratégia do Xbox Game Pass também apresenta uma abordagem semelhante e não vive somente de jogos indies. Os jogadores poderão acessar títulos como Forza Horizon 5, S.T.A.L.K.E.R. 2 e Back 4 Blood; um trio de respeito e bem atrativo para o público, sem contar com a chegada de Hades.

Em resumo, os serviços de streaming com jogos por assinatura ficam fortalecidos com a presença das grandes obras e a indústria dos AAA pode existir por mais longos anos com produções de alto nível.

O que você acha? Os jogos por assinatura vão matar os AAA?

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