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PC topo de linha ou console da nova geração: quem leva vantagem no longo prazo?

por Felipe Gugelmin
PC topo de linha ou console da nova geração: quem leva vantagem no longo prazo?

Embora a chamada “Guerra de Consoles” geralmente envolva os produtos da Sony, Nintendo e Microsoft, sempre há um “competidor” que acaba correndo por fora e sendo usado como argumento por aqueles que defendem o poder bruto: o computador pessoal, ou simplesmente PC. Criados com propósitos que vão muito além dos games, essas máquinas surgem como alternativa para quem procura mais liberdade de configurações e sempre jogar com o máximo desempenho que seu hardware — e carteira — permite.

Mesmo que pareça simples, decidir entre investir em um bom PC ou em um console de nova geração não é tão fácil assim. Com os custos de aparelhos e jogos nas alturas, é preciso pensar não somente no momento atual, mas também no longo prazo: daqui há 4, 5 anos, qual investimento vai valer mais? E para além disso, o que vai compensar mais o dinheiro investido agora?

Como alguém que tem o privilégio de conseguir investir tanto em consoles quanto em um bom PC, tento responder algumas dessas perguntas neste artigo. No entanto, também trago alguns questionamentos que, em última instância, somente você vai poder responder — afinal, o valor sentimental que damos a certos tipos de experiência muitas vezes contam mais do que qualquer argumento que “faz sentido no papel”.

O fator Brasil

Antes de iniciar a argumentação sobre as vantagens e desvantagens de escolher um console ou um PC, é preciso falar de algo que pesa muito nessa discussão, especialmente em 2021: o tal do “fator Brasil”. Dada a situação econômica do país, somada ao preço dos componentes, há somente uma resposta honesta que posso dar a quem pensa em montar uma máquina de jogos atualmente: não vale a pena.

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Novas placas de vídeo são poderosas, mas chegam ao mercado com preços pouco atrativos.

Desde o começo da pandemia, o mercado global de componentes está sofrendo com problemas de abastecimento que não devem ir embora tão cedo. Somando isso ao fato de que muitas pessoas tiveram que se adaptar ao trabalho em home office — e, com isso, adquirir um desktop mais potente ou fazer um upgrade —, a situação causou uma grande escassez de componentes no mercado, o que fez com que o preço deles aumentasse consideravelmente.

Como se isso não bastasse, o gamer brasileiro também sofreu com a grande desvalorização do Real no período e nossa já histórica “especulação”, que levou o preço dos componentes à altura. Como exemplo, cito a popular GTX 1660, componente considerado como “de custo benefício” que, no final de 2019, podia ser encontrado facilmente por R$ 1200 ou menos. Atualmente, o mesmo componente está na casa dos R$ 3 mil, já tendo chegado a picos de R$ 4 mil ou mais.

Infelizmente, não há uma previsão de quando as coisas vão se normalizar. Com isso, ao menos agora não há mais como se falar em “PC Gamer baratinho” de entrada, que representa um bom investimento no qual é possível construir uma base para o futuro. Assim, no que diz respeito a este artigo, vou usar como base de comparação os preços do mercado norte-americano — caso contrário, toda a “discussão” poderia ser resumida a “se você só quer jogar algo recente, em nosso país, consoles são a única alternativa economicamente viável”.

Consoles trazem poder e conveniência

Poder e, principalmente, conveniência, são as principais marcas dos consoles da nova geração. Seja sua escolha o PlayStation 5 ou o Series X (o Series S entra mais numa categoria de custo/benefício), a máquina que você vai levar para casa vai ser capaz de rodar bem títulos recentes com uma quantidade generosa de detalhes gráficos e com a facilidade de simplesmente precisar ligá-la na tomada e na conexão HDMI para tudo funcionar.

Claro, em alguns sentidos há certas semelhanças com o universo do PC: você pode fazer alguns upgrades de componentes e, muitas vezes, vai ter que lidar com alguma atualização de software antes de poder jogar — mesmo que tenha comprado a versão física de um jogo para agilizar o processo.

PS5
PlayStation 5 pode ser uma alternativa para experimentar jogos de ponto investindo um pouco (comparado aos PCs)

Outra vantagem do universo dos consoles é que é muito mais fácil você ter ideia de qual jogo roda em sua plataforma, e como isso acontece. Sim, pode haver uma diferença de desempenho entre jogar a versão PlayStation 4 ou PlayStation 5 de um game (Ghost of Tsushima, por exemplo), mas você sempre vai ter certeza de que, sendo o título compatível com sua plataforma, não vai ser preciso fazer ajustes e malabarismos para conseguir jogá-lo.

Nos PCs, a história é um tanto diferente: devido às infinitas possibilidades de configuração oferecidas por esse universo, nem sempre há a certeza de como sua máquina vai rodar um jogo novo — ou se ele sequer vai rodar. Enquanto as coisas estão muito mais fáceis e simples atualmente do que há alguns anos (o tal DLL faltando é coisa do passado), as coisas não são tão garantidas nesse sentido.

Costuma brincar que, em alguns casos, rodar um game no PC tem toda uma metalinguagem de puzzle envolvida antes de você chegar à experiência desejada. Atualizações de drivers, mudanças nos executáveis feitos em bloco de texto ou o download de patches feitos pela comunidade podem ser necessários para abrir alguns títulos, especialmente os mais antigos. Em alguns casos, você pode só “dar azar” do game escolhido ter feito parceria com a empresa concorrente da fabricante de sua GPU. Felizmente, atualmente as coisas estão mais simples de resolver e há infindáveis guias na internet ajudando você a chegar onde deseja — no entanto, a comodidade oferecida pelos consoles continua sendo bem mais atrativa para quem só quer chegar em casa, sentar no sofá e jogar.

Um PC equivalente pode custar o dobro

Mesmo para os padrões internacionais, tanto o PlayStation 5 quanto o Xbox Series X são considerados consoles caros — a faixa de US$ 499 pode parecer “acessível” para os brasileiros em uma conversão direta (ainda mais levando em conta os preços locais), mas os aparelhos em si não são exatamente baratinhos para o padrão de vida dos Estados Unidos.

Felizmente, o preço é compensado por hardware robustos, que se aproximam muito mais do topo de performance encontrado em PCs atuais do que o PlayStation 4 e o Xbox One se aproximavam em suas épocas de lançamento. Tanto é que, para montar do zero uma máquina com um desempenho esperado semelhante ao do PlayStation 5, é preciso gastar mais do que o dobro — estimativas do site Gaming Bolt mostram que o investimento fica na casa dos US$ 1100 (mais de R$ 6 mil em uma conversão direta).

Levando em conta o “fator Brasil” mencionado anteriormente, as coisas ficam surreais: somente a RTX 3060, recomendada pelo site como equivalente ao poder oferecido pela GPU RDNA 2 do console, custa entre R$ 4,5 mil e R$ 6 mil nas lojas brasileiras, dependendo do modelo. Vale notar que não há como fazer uma equivalência de um pra um entre peças de PC e aquelas encontradas nos consoles (que são customizadas para eles), somente trabalhar com aproximações — que, em todo caso, acabam saindo mais caras para o lado do PC.

PCs são sobre liberdade e escolha

Dadas as comparações, parece claro que, do ponto de vista do custo-benefício, investir em um console parece a solução mais inteligente. E realmente é, caso sua única intenção seja jogar games recentes com a maior conveniência possível — e digo isso na posição de alguém que, desde 2012, tem no computador como seu principal meio de jogatina.

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Um PC pode oferecer mais liberdade

No entanto, a comparação com os consoles acaba no momento em que falamos dos propósitos reais de cada máquina. Enquanto o PlayStation 5 e o Xbox Series são essencialmente máquinas de entretenimento (jogos e filmes/conteúdos por streaming), computadores podem ser usados para propósitos muito mais amplos do que esses.

Caso você prefira jogar no PC, provavelmente já ouviu alguém falando que “computador é para planilha” — e essa pessoa não está necessariamente errada. No entanto, além de planilhas, computadores são máquinas que proporcionam diversas oportunidades de navegação pela internet, produção de conteúdo, transmissões ao vivo e toda uma série de atividades que surgem, no máximo, de forma limitada nos consoles.

Outra vantagem dos computadores é que, no médio a longo prazo, eles tendem a ser investimentos que “se pagam” se o objetivo é continuar jogando games com o máximo desempenho possível. Sim, o valor de entrada é alto — especialmente dada a situação do Brasil atual —, mas uma boa base de hardware costuma durar anos sem precisar de um upgrade — e, quando ele é necessário, dificilmente envolve trocar a máquina completa.

Enquanto novos processadores, modelos de memória RAM e GPUs saem a cada ano, você não precisa necessariamente ter tudo novo para se manter atualizado no mundo dos games. Da mesma forma, você não precisa necessariamente sempre mirar no máximo desempenho possível para ter uma boa experiência — se o seu negócio é jogar com altas taxas de quadros por segundo, mas 4K não sentido para seu setup atual, não é preciso necessariamente ter uma placa de última geração para cumprir seu objetivo.

Na prática, o PC tem como principal vantagem a liberdade de escolha: você pode decidir montar uma máquina com componentes mais modestos (e evoluí-la com o passar dos anos), escolher monitores com resoluções customizadas às suas necessidades e até mesmo definir como vai jogar: mouse e teclado, gamepad (de qualquer marca) e controles por movimento são somente algumas das opções.

PCs levam vantagem na biblioteca de jogos

Na hora de escolher um console para jogar, um fator que pesa muito para os consumidores são os exclusivos. Enquanto o PC não é conhecido necessariamente por isso, a plataforma tem uma dose generosa de títulos que só podem ser jogados lá: séries como Total War, Anno e outros games de estratégia raramente fazem sua transição para os consoles de mesa e, quando isso acontece, há uma série de adaptações e sacrifícios envolvidos.

Também podemos citar jogos de alto alcance como Star Citizen, boa parte do mercado de realidade virtual — incluindo o elogiado Half-Life: Alyx —, MOBAs famosos como League of Legends e DOTA 2 e toda uma série de jogos independentes que fazem sua estreia meses (ou anos) antes no PC em relação aos consoles.

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Oferta de jogos nos PCs pode ser um diferencial.

Se games exclusivos não são um fator decisivo em sua escolha, o PC traz a vantagem de, em geral, sempre oferecer a melhor versão possível de títulos multiplataforma — que podem ser modificados das mais diversas maneiras possíveis. Seja para melhorar desempenho, trazer conteúdos de história cortados ou simplesmente “bagunçar as coisas”, muitos jogos possuem uma comunidade de modders dedicada que assegura a sobrevida de muitos games por anos após seus lançamentos.

Somando isso ao fato de que os computadores possuem uma retrocompatibilidade ilimitada, é fácil entender porque muita gente não sai desse universo. Um game comprado no Steam em 2010 continua compatível com os hardwares atuais — e muitas vezes roda melhor agora do que em seu lançamento —, e pode se tornar ainda mais belo graças a pacotes de textura, modelos novos e outras modificações obtidas facilmente na internet.

Não à toa, remasterizações são algo bastante criticado pela comunidade do PC: se nos consoles elas são necessárias para manter jogos antigos acessíveis, no computador muitas vezes a comunidade já trabalhou em muitas das melhorias que estão sendo vendidas novamente pelas desenvolvedoras. Não à toa, é comum haver casos em que jogadores se revoltam contra decisões de empresas em remover as versões originais das lojas digitais.

Exemplo disso é a recente GTA Trilogy, que se torna bastante desnecessária para quem já tem os games originais e se aventura no mundo dos mods. Nesse caso, também não ajudou muito a Rockstar ter adotado ações legais contra a comunidade que se dedicou a atualizar seus jogos, especialmente dado o resultado duvidoso da remasterização oficial.

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Para completar, o PC oferece a oportunidade de escolhermos com maior liberdade as lojas em que vamos adquirir jogos. Se elas também usam da exclusividade como diferencial (e barreira para acessar alguns títulos famosos), a maioria compartilha boa parte do catálogo, permitindo que o jogador decida onde investir seu dinheiro e faça comparações de preço rápidas. Também é possível decidir se você quer ou não ter DRM em seus jogos, graças a iniciativas como o GOG e o Itchi.o (um prato cheio de experiências diferentes e, muitas vezes, gratuitas).

Na prática, a única desvantagem real da biblioteca de jogos para PC é o fato de que o mercado de jogos físicos atualmente se reduziu a um nicho voltado a colecionadores. Assim, se ter caixinhas é algo de que você não abre mão na hora de jogar, a transição para a plataforma pode acabar representando uma mudança bastante radical para seus hábitos de consumo.

Tudo depende de seus hábitos

Seria muito fácil “ficar em cima do muro” e afirmar que a decisão entre um console de mesa de nova geração e um computador é mera “questão de gosto e dinheiro” — e não sinto que estaria mentindo se fosse por esse caminho. No entanto, dado o contexto atual, não há muito o que argumentar: de curto a médio prazo, faz muito mais sentido investir em um console para jogos do que um PC dedicado a eles.

Não somente os preços do PlayStation 5 e do Xbox Series X estão mais convidativos do que os de hardwares equivalentes (o que não significa que eles são baratos), como a retrocompatibilidade de ambas as plataformas significa ter acesso imediato a uma grande biblioteca de jogos — muitos deles baratos, especialmente se você se aventurar pelo mercado de usados.

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O PC continua sendo a melhor opção para quem deseja ter o maior desempenho possível, e consegue fazer o investimento necessário para isso, que não sai nada barato. No entanto, ao menos no momento atual, só vale mesmo investir em uma máquina poderosa se você quer usar ela para atividades que vão além dos games — editar vídeos, produzir conteúdos, trabalhar, navegar pela internet etc. —, que também vão se beneficiar por tabela do investimento.

Pessoalmente, decidi continuar investindo no PC nesta geração por já ter montado há anos a base do que é minha máquina atual. Se você está na situação em que o investimento em uma nova GPU, CPU ou pente de memória RAM é suficiente para mantê-lo jogando games mais recentes, então daí sim pode ser uma boa ideia investir em um upgrade do que em um console de mesa. No entanto, se o intuito é começar do zero, o investimento vai demorar a valer a pena — e ninguém melhor do que você sabe o quanto sua carteira e outras responsabilidades pesam nessa hora.

E você, de que lado está nessa disputa? Acha que vale mais investir em um bom PC gamer e ter todo o poder possível à disposição, ou não abre mão da praticidade e custo-benefício dos consoles de mesa?