Fim da Monolith enterra história de estúdio que merecia muito mais
Estúdio fechado pela WB Games deixou legado que deve ser lembrado por muitos anos
Em 25 de fevereiro, a WB Games anunciou o fechamento da Monolith Productions, em uma decisão que apagou as luzes de um dos estúdios mais criativos da empresa. A notícia pegou os fãs de surpresa e gerou novas discussões da comunidade, que tentou especular os reais motivos por trás da despedida.
Junto com o fim do estúdio, veio o cancelamento do aguardado jogo da Mulher-Maravilha, projeto que prometia explorar o universo de Diana Prince com a mesma ambição que marcou os trabalhos anteriores da equipe. A notícia, revelada inicialmente por Jason Schreier, da Bloomberg, encerra uma trajetória de quase três décadas que deixou marcas profundas no mercado.
A Monolith, responsável por franquias icônicas e pela criação do revolucionário Nemesis System, sai de cena em um momento de reestruturação drástica da Warner, mas sua história clama por um reconhecimento que o destino, ao que parece, resolveu negar.
O fechamento e as razões por trás da decisão
A Warner justificou o fechamento da Monolith como parte de uma estratégia para “estruturar os estúdios de desenvolvimento e investimentos em torno da construção dos melhores jogos possíveis com nossas principais franquias”, conforme declarou em comunicado ao Kotaku.
O foco agora será em Harry Potter, Mortal Kombat, DC e Game of Thrones, áreas que a empresa enxerga como mais lucrativas e estáveis. A Monolith, ao lado da Player First Games, de MultiVersus, e da WB San Diego, caiu na guilhotina dessa reformulação, mesmo com o game da Mulher-Maravilha já estando há anos em desenvolvimento e ter custado cerca de US$ 100 milhões.
Por trás da decisão, pesa o desempenho financeiro recente da editora. Títulos como MultiVersus, Esquadrão Suicida: Mate a Liga da Justiça e Harry Potter: Campeões do Quadribol não alcançaram as expectativas, resultando em perdas estimadas em US$ 300 milhões de dólares no último ano, segundo Schreier.

Gotham Knights e até Mortal Kombat 1, apesar de seus sucessos relativos, também ficaram aquém do que a empresa esperava. Nesse cenário, a Monolith, que não lançava um jogo desde Terra-Média: Sombras da Guerra em 2017, tornou-se um alvo prioritário. E a produção conturbada de Mulher-Maravilha, com reinícios, trocas de diretores e falta de progresso visível, foi a pá de cal.
A Warner optou por concentrar recursos em apostas mais seguras, sacrificando um estúdio que, ironicamente, já provou ser capaz de entregar inovação e qualidade em um passado não muito distante.
Polêmicas que mancharam a reputação
Nos últimos anos, a Monolith não escapou de controvérsias que, embora não tenham destruído seu legado, lançaram dúvidas sobre sua operação. O maior escândalo veio com o lançamento de Terra-Média: Sombras da Guerra.
Sequência de Sombras de Mordor, amplamente elogiado por sua jogabilidade e pelo impressionante Nemesis System, enfrentou críticas por incluir microtransações agressivas. Caixas de loot, que ofereciam vantagens em progressão e recrutamento de inimigos, frustraram por bastante tempo, sendo apontadas como uma interferência direta na experiência de jogo.
Na época, a reação foi tão negativa que a editora decidiu remover o mercado in-game meses após o lançamento, mas o dano à imagem já estava feito.

Outra polêmica surgiu em 2021, quando a Warner conseguiu patentear o Nemesis System. O movimento também gerou revolta entre desenvolvedores independentes e veteranos da indústria, pois a patente, válida até 2036, limitou o uso de ideias interessantes de jogabilidade por outros estúdios.
Profissionais como Cat Manning, da Riot Games, classificaram a ação como “nojenta”, argumentando que ela aprisionava uma inovação que poderia evoluir em outras mãos. A Monolith, que apenas desenvolveu o sistema, acabou associada ao desgaste dessa decisão corporativa, o que reforçou a percepção de que a Warner priorizava lucros sobre a criatividade de um dos seus principais setores.
Além disso, o silêncio prolongado do estúdio após Sombras da Guerra alimentou especulações e desconfianças. Rumores apontavam para projetos ambiciosos, como uma nova IP de ficção científica ou adaptações de Blade Runner e Duna, mas nada se concretizou.
A saída de diretores importantes, como Kevin Stephens, para a Electronic Arts em 2021, sugeriu instabilidades internas. Esses episódios, somados à fusão da WarnerMedia com a Discovery, pintaram um quadro de um estúdio talentoso preso em um limbo corporativo e totalmente incapaz de retomar à sua era de ouro.
Legado de grandes jogos e franquias
Apesar das turbulências, a Monolith Productions construiu um portfólio que poucos estúdios conseguem igualar. Fundada em 1994 em Kirkland, Washington, a equipe começou chamando atenção com títulos como Blood e No One Lives Forever, que misturavam narrativa e ação com irreverência.
Seu verdadeiro salto veio anos depois, com F.E.A.R. Lançado em 2005, o jogo de tiro em primeira pessoa chamou a atenção por introduzir uma inteligência artificial avançada e atmosfera de terror psicológico, tornando-se um marco da geração e influenciando até hoje o gênero de ação com suspense.
Nesse mesmo ano, Condemned: Criminal Origins marcou a estreia da Monolith Productions no Xbox 360 e consolidou sua fama por criar atmosferas densas e perturbadoras.

No jogo, o jogador assume o papel de Ethan Thomas, um agente do FBI que investiga crimes brutais em uma cidade decadente e deve enfrentar inimigos insanos com armas improvisadas em combates viscerais. Com uma mistura de terror psicológico e mecânicas de investigação, Condemned se destacou pela ambientação sombria e pela tensão constante ao melhor estilo suspense noir.
Apesar de sua sequência, Condemned 2: Bloodshot, ter dividido opiniões em 2008, o original se tornou um clássico cult subestimado que reflete o talento da Monolith para explorar o lado mais obscuro e brutal da experiência humana.
O auge, no entanto, chegou com a série Terra-Média. Em 2014, Terra Média: Sombras de Mordor surpreendeu o mundo ao trazer uma visão fresca do universo de Tolkien. O jogo combinava combate fluido, inspirado em Batman: Arkham, com uma narrativa original centrada em Talion e Celebrimbor.

Sombras da Guerra, de 2017, expandiu essa fórmula, aprofundando a exploração de mundo aberto e entregando batalhas épicas. Apesar das críticas às microtransações, ambos os títulos venderam milhões de cópias e conquistaram uma base fiel de fãs, provando que a Monolith sabia criar experiências memoráveis a partir de franquias consagradas.
Outros feitos incluem o desenvolvimento do motor gráfico LithTech, que deu vida a muitos de seus jogos, e colaborações em projetos como Hogwarts Legacy e Mortal Kombat 1. A Monolith não apenas entregava jogos; ela moldava tendências e mostrava como a tecnologia podia enriquecer histórias e interações.
O Nemesis System e a revolução no mercado
Nenhum feito da Monolith brilha tanto quanto o Nemesis System, introduzido em Sombras de Mordor. Essa mecânica transformou inimigos genéricos em personagens únicos, com personalidades, memórias e rivalidades que evoluíam conforme o jogador interagia com eles.
Um orc derrotado podia voltar mais forte, com cicatrizes e um discurso de vingança, enquanto outro poderia trair aliados por medo ou ambição. O resultado era um mundo vivo, imprevisível, que reagia às ações do jogador de forma orgânica.
O impacto do Nemesis System ressoou pela indústria. Desenvolvedores como Ken Levine, criador de BioShock, elogiaram sua capacidade de criar narrativas emergentes, enquanto jogadores viam nele um olhar para o futuro dos jogos de mundo aberto.

A mecânica inspirou tentativas semelhantes em outros títulos, embora a patente da Warner tenha freado sua adoção em larga escala. Mesmo assim, o sistema permanece um testemunho do potencial da Monolith para inovar, elevando o padrão de como os jogos podem simular vida e profundidade.
Um fim que não faz justiça
O fechamento da Monolith Productions não reflete seu valor histórico ou criativo. Em um mercado saturado de sequências previsíveis e fórmulas recicladas, o estúdio se destacava por arriscar, por transformar ideias em sistemas que desafiavam convenções.
Seus jogos marcaram gerações — de adolescentes assustados com F.E.A.R. a adultos fascinados pela Terra-Média interativa de Sombras de Mordor. A decisão da Warner, movida por números e estratégias de reformulação, enterra uma equipe que merecia mais: mais tempo, mais liberdade, mais chances de mostrar ao mundo o que ainda podia criar.
O jogo da Mulher-Maravilha, que prometia aplicar o Nemesis System ao universo de Themyscira, poderia ter sido a redenção da Monolith e um retorno triunfal após uns bons anos de silêncio. Em vez disso, torna-se um símbolo do que foi perdido.
A desenvolvedora sai de cena, mas suas conquistas — e o vazio que deixa — garantem que seu nome ecoe por anos entre aqueles que entendem o que ela representou.
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