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Remakes, remasters e reboots: entendendo os “três rês”

Quando e como cada um dos tratamentos acontece em jogos clássicos

por João Gabriel Nogueira
Remakes, remasters e reboots: entendendo os “três rês”

Os remakes, remasters e reboots – os três “rês” – estão ficando cada vez mais comuns entre as estreias de jogos, e algumas vezes chamando a atenção pelo pouco tempo que esperam antes de refazer um jogo para lançar e cobrar de novo.

The Last of Us Part I é um dos títulos que mais chamam a atenção quando falamos do assunto, não só por trazer um remake de um game de apenas nove anos de idade, mas também por ser justamente um jogo considerado entre os que se seguram muito bem ainda atualmente, tanto em suas mecânicas como nos gráficos.

The Last of Us Part I

Então existe uma idade “apropriada” antes de um jogo ser re-lançado para ser comprado novamente? Quais são os critérios para um título merecer um remake, remaster ou reboot? Quais as diferenças nesses tratamentos? Vamos ao debate, neste artigo.

Diferenças entre Remake, Remaster e Reboot

Antes de desenvolvermos o assunto, é importante entender bem as diferenças entre cada um dos tratamentos oferecidos para um game que esteja retornando das antigas. Remake, remaster e reboot são coisas diferentes, como a maioria de vocês sabem, mas as suas definições ainda podem causar alguma confusão e vale a pena deixar tudo explicado.

Vamos começar pelo reboot, porque remake e remaster costumam causar mais confusão. O reboot é uma renovação completa da obra original, adaptando não só o gameplay e os gráficos, mas também sua história e acontecimentos. O Tomb Raider de 2013 é um dos melhores exemplos, porque mudou bastante da franquia, mas ao mesmo tempo foi muito bem recebido.

Tomb Raider

O reboot não deve ser confundido com uma prequel. A prequel, como no caso de Metal Gear Solid 3, por exemplo, conta uma história que aconteceu antes de jogos lançados anteriormente, mas que se amarra e faz parte da narrativa principal. MGS 3 não exclui os acontecimentos de MGS 1 e 2, apenas traz a história dos acontecimentos que se passaram antes desses games, que inclusive levaram a eles.

Esse estilo de renovação é muito característico pela sua intenção de levar a série por um novo caminho, são jogos já feitos com o objetivo de ter continuações, como aconteceu com Tomb Raider. A tradução da palavra ajuda a entender, uma vez que reboot significa “reiniciar”.

Os remakes e remasters, por sua vez, são novas versões de jogos originais. Remake significa “refazer”, enquanto remaster não tem uma tradução direta, apenas “aportuguesamos” a palavra para “remasterizar”.

De todo modo, a tradução nos ajuda novamente a entender as diferenças. Os remakes, de fato, refazem todo o jogo, enquanto o remaster faz um tratamento especial em suas texturas e assets para aproveitar melhor a capacidade de hardwares mais atuais, mas ainda é o mesmo jogo.

Final Fantasy X

Um bom exemplo aqui está no próprio The Last of Us. Além do já citado remake para o PS5, que adiciona o Part 1 ao nome do jogo, esse é um título que também recebeu um remaster, para o PS4, em 2014. Não é difícil ver pessoas trocando as bolas entre as versões do game.

O melhor jeito de diferenciar está na mudança de engine, o famoso motor gráfico. Se a nova versão do jogo muda sua engine – como vai acontecer com The Witcher, por exemplo – esse game necessariamente será um remake, porque terá que ser refeito num novo motor. Só que vale ressaltar que também é possível fazer um remake na mesma engine, o que ajuda mais na confusão.

A confusão entre remake e remaster

Remake e remaster geram confusão porque são dois tipos de tratamentos diferentes para o relançamento de um jogo específico, enquanto o reboot não mira num game só, mas pensa em toda uma franquia.

Para ajudar na dificuldade, o marketing ainda traz outra definição para remake e remaster que não obedece a regra técnica, e é importante explicar aqui.

Como o remake é uma reconstrução completa de um game original, é bem comum que ele tenha várias diferenças não só nos gráficos, mas também no gameplay e até na história, às vezes. Final Fantasy VII é um ótimo exemplo aqui, trazendo muitas mudanças ao game no estilo e na ordem de seus acontecimentos.

Imagem de capa do jogo Final Fantasy VII Remake com o protagonista em destaque

O remaster, enquanto isso, não faz alterações tão extensivas porque ainda é feito por cima do jogo original. As texturas recebem algum polimento, são adicionados efeitos e dá pra mexer um pouco nos controles, mas nada tão impactante como acontece no remake.

Por causa dessa distinção, os marketeiros de plantão decidiram chamar jogos que na verdade são remakes de remasters quando eles querem destacar que não foram feitas alterações ao formato original do game. O jogo foi, sim, refeito, mas seguiu à risca seu primeiro lançamento. Os melhores exemplos neste caso são a trilogia de Crash Bandicoot e Spyro, que levam “remaster” em seus nomes, porém, em termos técnicos, são remakes – foram refeitos em outra engine e tudo.

Para evitar confusão e ambiguidades neste artigo, a partir deste momento vou me referir a remakes e remasters partindo de suas definições técnicas. Quando eu quiser falar de um remake extremamente fiel ao original vou chamar apenas disso, de um remake fiel, ou um remake “um pra um”. Reservarei o termo remaster às verdadeiras remasterizações dos jogos originais.

Qual o momento de “ressuscitar” um game?

Depois de explicar os termos e suas diferenças, vamos direto à pergunta mais polêmica: quando, afinal de contas, se justifica fazer um remake, remaster ou reboot de uma franquia?

Essa é uma daquelas perguntas que não tem somente uma resposta, e vai variar bastante dependendo do contexto e de qual jogo estamos falando. Vamos começar, então, falando das respostas que parecem mais comuns.

Em termos gerais, quando analisamos comentários na internet e a recepção de anúncios de novos remakes, remasters ou reboots, dá para perceber que jogos do PS1 para trás costumam ser muito bem recebidos, com raras exceções. Alguns dos jogos já citados nesta review – como Final Fantasy VII Remake e as trilogias de Crash Bandicoot e Spyro originais – foram aclamados em seus anúncios e lançamentos. O FF VII, em específico, veio depois de anos dos fãs pedindo por um remake.

Spyro the Dragon

Enquanto isso, na lista de “games que gostaríamos de volta”, vemos aparecer, na maior parte, jogos dessa geração e época.

Quando vamos para o PS2 ainda temos diversos jogos sendo bem recebidos em seus remakes, como o ainda não lançado Resident Evil 4 e o recém-anunciado Silent Hill 2. O número de “candidatos” é menor, mas ainda temos vários pedidos e muitos dos anúncios dessa geração são bem recebidos.

É do PS3 em diante que a balança vira e passamos a ter um interesse menor nos remasters e muito menor em remakes. É aqui que vimos o tão elogiado The Last of Us encontrar muita polêmica quando passou pelos dois tratamentos.

Analisando os exemplos, podemos resumir que é uma mistura de idade, qualidade do jogo original e nostalgia que resulta num remake, remaster ou reboot. Mas é importante fazer um aprofundamento quando falamos de “idade”.

A idade de um game não é apenas seu número de anos, mas determina também a geração em que ele foi originalmente lançado. Quando temos grandes saltos de tecnologia e técnicas gráficas, fica mais interessante que um jogo seja refeito para aproveitar essas novidades e se aproximar mais da visão que um dia seu criador teve em sua imaginação.

É o que vimos com Resident Evil 2, por exemplo. É um remake que alterou bastante as mecânicas do jogo original, mas foi ovacionado em seu lançamento, por fãs e novos jogadores. A recriação do jogo mostrou entender perfeitamente o que era a experiência de ter jogado o RE 2 no PS1 e conseguiu modernizar e transportar isso para consoles mais atuais.

Resident Evil 2 de PS1

Esse é um dos motivos do PS1 ser uma “marca” comum para a ressurreição de jogos ser bem recebida. Nessa geração o 3D nem era “verdadeiro” ainda, usando recursos de directdraw e gráficos low poly para entregar uma experiência próxima do tridimensional. O salto que temos para o PS2 é um dos mais marcantes da história da indústria, e faz jogos a partir desse momento serem bem mais próximos do que estamos acostumados hoje em dia – salvo as devidas proporções, obviamente.

Qual “rê” escolher?

A partir do momento em que se decide pelo retorno de um game ou franquia antigos, a próxima indagação natural é a de qual tratamento oferecer ao produto para este retorno.

Começamos, novamente, pelo reboot, que é mais fácil. Reitero que o reboot mira numa franquia como um todo, não apenas em um único título. Sendo assim, séries de jogos que ainda contam com lançamentos recentes, raramente recebem esse tipo de tratamento.

O reboot normalmente é reservado para franquias de sucesso que não trazem um novo lançamento bem sucedido há algum tempo. O já citado Tomb Raider e também Doom são ótimos exemplos, de jogos que tiveram seus “anos de ouro”, depois contaram com títulos mais criticados e foram parar na geladeira por alguns anos. Essa é a situação ideal do reboot – quando “baixa a poeira”, a produtora traz uma ressurreição pra série, com um novo game, novas mecânicas, levando a história por um caminho inédito.

DOOM

Já os remakes e remasters geralmente acontecem em títulos específicos de muito sucesso no passado – tanto os que são parte de franquias que ainda estão recebendo lançamentos, como em jogos standalone que ficam nos corações dos jogadores.

Neste caso fica bem interessante citar Silent Hill. A série ficou anos na geladeira da Konami depois de alguns lançamentos bem desastrosos e estava em momento ideal para um reboot. Ao mesmo tempo, Silent Hill 2 é um dos títulos mais icônicos da história do videogame, não apenas no gênero do terror. O que a produtora optou por fazer, então? As duas coisas.

Admito que estou me precipitando. Silent Hill 2 teve seu remake confirmado, mas ainda não temos informações suficientes sobre Silent Hill f para chamar o jogo de um reboot propriamente dito ou de uma continuação.

Mas entre remaster ou remake – qual escolher? Os remakes normalmente acontecem em lançamentos maiores, que a produtora aposta muito nas vendas não somente para jogadores das antigas, mas também para atingir um novo público. Já os remasters acontecem mais como uma maneira de portar jogos antigos para gerações atuais e costumam ser lançamentos mais “humildes”.

Silent Hill 2

O exemplo de Silent Hill 2 volta a nos servir bem aqui porque um game aclamado como este faz todo sentido voltar como um remake. Só que fica mais interessante ainda quando levamos em conta os boatos de que a Konami perdeu grande parte dos arquivos do jogo original, simplesmente não tendo mais a opção de fazer um remaster.

Vamos falar de números

Comecei o artigo mencionando como estão cada vez mais comuns as “ressurreições” dos jogos, mas vamos deixar a informação menos vaga, trazendo algumas estatísticas do grupo Nielsen que serão úteis para o próximo segmento deste texto também.

Segundo a empresa de pesquisas de mercado, a receita digital de grandes remakes praticamente dobrou entre os anos de 2018 e 2020. Os analistas da firma apontam a pandemia como um dos motivos para o aumento de rendimento em 2020, já que todo o mercado de games se aqueceu durante o período. Mas eles ressaltam também o apelo nostálgico desses games para o impacto positivo nas vendas.

Segundo dados da ESA (Entertainment Software Association) nos Estados Unidos, 74% dos pais que jogam videogame disseram que também jogam com seus filhos. Esse é um fator que reflete no potencial de venda de jogos antigos retornando, não apenas para os jogadores entre 35 e 44 anos que se sentem nostálgicos por esses games, mas também para seus filhos mais jovens que foram expostos a eles pelos pais.

O gráfico abaixo também é relevante para a discussão, mostrando o número de vendas dos maiores remakes de 2020 durante o primeiro mês de suas vendas digitais nos consoles:

1

Não temos dados suficientes para afirmar com certeza, mas o gráfico levanta uma possibilidade interessante. Reparem que o remake de Resident Evil 3 vendeu mais que Resident Evil 2 em seus respectivos primeiros meses de lançamento, apesar do jogo anterior ser mais popular. O mesmo aconteceu com Crash Bandicoot, em relação à sua trilogia original que vendeu menos que o remake da do jogo de kart do marsupial, lançado depois. Seria esse um indício que o lançamento de um remake ou remaster de um jogo antigo ajuda também a impulsionar as vendas de novos remakes na mesma série?

Se for verdade, essa tendência aparece só no primeiro momento de lançamento do jogo. A longo prazo, o remake de Resident Evil 2 conta com 10 milhões de cópias vendidas, enquanto o RE 3 ficou em torno dos 5 milhões.

A simples REalidade

Podemos debater por horas se o retorno de um game do passado remoto ou recente faz sentido ou não, mas as produtoras que realmente tomam as decisões fazem apenas uma pergunta nessa discussão: “vai vender?”.

Não é uma questão de criticar a chamada “ganância” das produtoras, nem de justificar. É um simples fato. São empresas grandes com salários para pagar e acionistas para agradar que não podem investir no lançamento de produtos sem acreditar num retorno financeiro.

A conversa sobre a validade ou não de um The Last of Us Part 1 é importante e não deve ser ignorada. Mas é igualmente importante manter os pés no chão e entender que a decisão, da parte da Sony, foi simples – eles esperavam que o jogo fosse vender bastante (apesar que parece que erraram neste caso).

Joel dirigindo, enquanto Ellie olha a janela em The Last of Us Part I

Como, então, conseguir convencer uma produtora de que o remake, remaster ou reboot dos seus sonhos vai vender? Além de falar com a sua carteira, as campanhas em redes sociais parecem surtir algum efeito às vezes, mesmo que demore. Os remakes para Resident Evil 2 e Final Fantasy VII foram anunciados depois de anos dos fãs fazendo barulho nas contas de suas empresas.

E, se for assim, por que não começar sua campanha aqui nos comentários? Conta pra gente os jogos ou franquias que vocês gostariam de ver retornar, e digam qual tratamento (qual “rê”) iriam preferir!