O futuro dos videogames: como jogaremos daqui a 5, 10 e 15 anos?
Do domínio digital à fusão com a realidade: como a tecnologia, a IA e o comportamento dos jogadores moldarão a próxima geração de jogos
O mercado de videogames é uma das indústrias mais lucrativas do mundo, movimentando bilhões de dólares anualmente e alcançando públicos que transcendem gerações, culturas e geografias. Desde os gráficos limitados dos anos 1970 até as experiências imersivas em 4K de hoje, o cenário evoluiu em um ritmo impressionante.
Mas o que está por vir pode ser ainda mais revolucionário do que tudo o que já vimos. Com avanços em inteligência artificial, computação em nuvem, realidade aumentada, realidade virtual e o comportamento em constante mutação dos jogadores, o futuro dos videogames promete transformar profundamente como jogamos, interagimos e vivemos.
Pensando nisso, preparamos uma matéria especial com especulações sobre um futuro não tão distante do cenário. Será que veremos a ascensão de novas tecnologias ou apenas as atuais alcançarem patamares ainda mais elevados?
Próximos 5 anos (2025-2030): transição e adaptação
Nos próximos cinco anos, os videogames passarão por uma fase de transição, consolidando tendências que já estão em curso e pavimentando o caminho para mudanças mais concretas. Um dos pilares dessa evolução será o domínio absoluto do formato digital.
A mídia física, como discos blu-ray ou cartuchos, será relegada a nichos de colecionadores ou edições especiais de luxo, enquanto plataformas como Xbox Game Pass, PlayStation Plus e serviços similares se tornam o padrão de consumo.
Esse movimento, já evidente com a crescente adesão a assinaturas — o Game Pass, por exemplo, atingiu 25 milhões de assinantes em 2022 —, trará debates éticos e jurídicos, como o “direito de revenda digital”. Afinal, se os jogos são licenças em vez de produtos físicos, como os jogadores poderão negociar ou preservar seu acesso a longo prazo?

A inteligência artificial também começará a deixar marcas profundas no desenvolvimento de jogos. Ferramentas como ChatGPT (para diálogos), Stable Diffusion (para assets visuais) e outras IAs generativas serão integradas a engines como Unreal e Unity, reduzindo o tempo de produção e permitindo a criação de mundos mais ricos.
Imagine NPCs (personagens não jogáveis) com diálogos dinâmicos e comportamentos adaptativos, capazes de reagir de forma única às escolhas do jogador. Um estudo de 2023 da IEEE apontou que a IA pode cortar até 30% do tempo de desenvolvimento de assets, mas os desafios criativos permanecerão: como manter a autenticidade e evitar que os jogos pareçam “genéricos” diante de tanta automação?
Os jogos AAA, com orçamentos que já ultrapassam os US$ 200 milhões (como The Last of Us Part II), continuarão caros e arriscados. Para justificar esses investimentos, o modelo “jogo como serviço” — com atualizações constantes, temporadas e microtransações — será essencial.
Remakes e remasters, como o sucesso de Resident Evil 4, seguirão populares, enquanto jogos crossgen (compatíveis com gerações diferentes de consoles) maximizarão o retorno financeiro.

Os consoles, por sua vez, ainda terão força: o PS6 deve chegar por volta de 2028, seguindo o ciclo tradicional da Sony, e a tendência de dispositivos híbridos, como o Nintendo Switch, influenciará novos projetos. A integração entre plataformas (console, PC e mobile) será uma prioridade, com crossplay e progressão compartilhada se tornando padrão.
O perfil dos jogadores também mudará. A Geração Alfa (nascida após 2010) começará a dominar o mercado, trazendo hábitos multitarefa e preferência por experiências sociais em plataformas como Roblox e Minecraft. Para eles, jogar não é só vencer, mas criar, compartilhar e transmitir — a comunidade será tão essencial quanto o próprio jogo.
Paralelamente, o fenômeno crossmídia explodirá: Fortnite já mostrou o potencial de parcerias com marcas e celebridades (como o show de Travis Scott em 2020, visto por 12 milhões de pessoas), e isso se intensificará. Narrativas de jogos começarão a se expandir naturalmente para filmes, séries e produtos, criando ecossistemas transmídia mais consistentes.
10 anos (2030-2035): disrupção em curso
Em uma década, os videogames entrarão em uma fase de disrupção plena, impulsionada pela consolidação do streaming e da computação em nuvem. Serviços como Xbox Cloud Gaming e o hipotético PlayStation Cloud oferecerão experiências completas sem a necessidade de hardware dedicado — bastará uma smart TV, um app ou um dongle para acessar jogos de última geração.
A latência, um obstáculo atual, será minimizada graças a avanços na infraestrutura 6G, prevista para ampla adoção até 2030, segundo a Nokia. Isso democratizará o acesso, mas também desafiará os modelos tradicionais de posse e exclusividade.
A IA dará um salto qualitativo, permitindo a criação de mundos inteiros com comandos simples. Em vez de equipes de centenas de artistas, um pequeno grupo poderá “ditar” um jogo a uma IA, que gerará cenários, personagens e até narrativas.
NPCs evoluirão para algo próximo de simulações de vida real, com memórias persistentes e respostas contextuais baseadas em interações passadas — pense em um Skyrim onde cada aldeão se lembra de você e age de acordo.
Um relatório da MIT Technology Review (2024) sugere que, até 2035, IAs generativas poderão simular personalidades com até 90% de fidelidade a padrões humanos, transformando a imersão narrativa.

Os jogos AAA, porém, enfrentarão uma crise existencial. Com orçamentos podendo ultrapassar US$ 300 milhões, apenas mega publishers como EA, Tencent e Microsoft terão fôlego financeiro para produzi-los. Isso abrirá espaço para estúdios independentes e AA, que, munidos de IA e ferramentas acessíveis, criarão experiências inovadoras a custos reduzidos.
Os consoles físicos, embora ainda existentes, se tornarão “premium”, como toca-discos na era do streaming: apreciados por entusiastas, mas não essenciais. O foco estará em plataformas digitais e na operabilidade conjunta entre dispositivos.
Os jogadores deixarão de ser apenas consumidores para se tornarem criadores. Ferramentas como Roblox Studio se sofisticarão, permitindo que qualquer um construa mundos personalizados com economias reais (via NFTs ou moedas virtuais).
Avatares e inventários persistentes — imagine carregar sua espada de Elden Ring para outro jogo — criarão uma sensação de continuidade entre experiências.
Culturalmente, os jogos se transformarão em multiversos da cultura pop, com crossovers estruturais: licenças de filmes, músicas e marcas coexistirão em harmonia, e os jogos se consolidarão como plataformas de entretenimento social, cultural e econômico.
15 anos (2035-2040): a realidade mista
Em 15 anos, a linha entre videogames e vida real ficará borrada. A realidade aumentada, integrada ao cotidiano via lentes de contato ou implantes (já em desenvolvimento por empresas como Mojo Vision), projetará jogos diretamente no mundo físico. RPGs urbanos em tempo real, onde você interage com personagens virtuais enquanto caminha pela cidade, serão comuns.
Um estudo da Nature (2023) prevê que, até 2040, 60% das interações digitais ocorrerão em ambientes mistos, e os videogames liderarão essa revolução.
Os NPCs alcançarão um nível de sofisticação impressionante, com memória e consciência contextual. Será possível formar amizades, rivalidades ou até romances com IAs que “vivem” ao seu lado, adaptando-se ao seu comportamento ao longo de anos.

Narrativas emergentes, geradas dinamicamente pelo jogador, substituirão scripts fixos, oferecendo experiências únicas. A IA também permitirá que qualquer pessoa crie universos personalizados com facilidade — os estúdios tradicionais se transformarão em “curadores” ou “treinadores” dessas inteligências criativas, focando em qualidade em vez de quantidade.
Consoles, como os conhecemos, deixarão de existir. PlayStation, Xbox e Nintendo se reinventarão como ecossistemas de experiência, acessados via nuvem, apps ou AR. O jogador se tornará seu próprio avatar digital, vivendo em um metaverso persistente onde inventários, reputações e aparências são transportados entre jogos.
A crossmídia atingirá seu ápice: um jogo poderá gerar séries, filmes, HQs e produtos em tempo real, com a comunidade participando ativamente da evolução das IPs. O conceito de “fandom” será a base para criação e monetização, com jogadores co-criando o futuro de suas franquias favoritas.
O jogo é parte de quem somos
O futuro dos videogames será moldado por inteligência artificial, experiências de mídia cruzada e a centralidade da comunidade. O console como o conhecemos pode desaparecer, mas a paixão por explorar mundos fantásticos e contar histórias continuará a mover milhões.
Em 5 anos, veremos a transição; em 10, a disrupção; e em 15, a fusão entre jogo e vida. Se hoje um jogo é bom por ser imersivo, no futuro ele será bom por ser parte da nossa própria história — um reflexo de quem somos e do que sonhamos. Que venha o próximo nível.