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20 anos de Call of Duty, uma das maiores franquias de games do mundo

Entenda porque CoD foi o centro da luta do PlayStation para impedir a aquisição da Activision Blizzard

por João Gabriel Nogueira
20 anos de Call of Duty, uma das maiores franquias de games do mundo

Call of Duty vai completar 20 anos em outubro deste ano. Enquanto uma das franquias de jogos mais famosas do mundo se prepara para completar duas décadas, ela se tornou a principal bandeira na luta do PlayStation para tentar impedir a aquisição da Activision Blizzard pelo Xbox.

Ao que tudo indica, essa é uma guerra perdida, mas a Sony conseguiu pelo menos um acordo para garantir Call of Duty no PlayStation pelos próximos 10 anos. Então é interessante pararmos para analisar a história de CoD e como essa franquia se tornou tão grande e tão importante para os consoles, principalmente. 

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O Resgate do Soldado Ryan

Muitos jogadores sabem que a história de Call of Duty começa com uma outra franquia mais antiga – Medal of Honor. Mas talvez alguns leitores vão ficar surpresos em saber que a inspiração para essa outra série veio de ninguém menos que Steven Spielberg, depois de seu trabalho com o aclamado filme O Resgate do Soldado Ryan.

O filme foi lançado em 1998, fazendo sucesso esmagador com o público e crítica. Foram diversas as premiações para a obra no ano seguinte ao seu lançamento, incluindo o Oscar de melhor direção para Spielberg. Mas antes mesmo de terminar o longa-metragem e levá-lo aos cinemas, o famoso diretor já enxergava ali uma ideia de levar a experiência para os videogames.

Na época, Spielberg era um dos proprietários do estúdio de jogos Dreamworks Interactive. O diretor aproveitou o momento para lutar pela ideia de um novo formato de jogo, segundo relata Jamie Russel, autor do livro Generation Xbox:

“Spielberg, que estava na época em pós-produção para O Resgate do Soldado Ryan, veio para o escritório da Dreamworks Interactive e explicou sua ideia. Ele via O Resgate do Soldado Ryan como uma experiência educativa tanto quanto uma propriedade de entretenimento… Ele havia visto seu filho adolescente e seus amigos jogarem 007 Goldeneye no Nintendo 64. Poderia a Dreamworks criar um jogo de tiro na Segunda Guerra, ele imaginou, que os levaria a aprender sobre o conflito enquanto jogam?”

Não foi necessário muito trabalho para convencer o estúdio a fazer o game, que recebeu o nome de Medal of Honor e foi lançado em novembro de 1999 no PlayStation, enquanto O Resgate do Soldado Ryan ainda colhia seus louros do sucesso. O título foi muito bem recebido pela crítica e logo se tornou o título mais vendido da história da Dreamworks Interactive, mas nem tudo foram boas notícias para o estúdio.

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Apesar do sucesso do game quando ele finalmente fez sua estreia, a fase de desenvolvimento até lá foi muito cara e causou prejuízos severos ao estúdio. Até os lucros começarem a entrar, acordos já estavam em andamento para vender o estúdio para uma produtora muito sortuda – a EA. Spielberg chegou a chamar essa decisão da coisa “mais esperta e mais estúpida” que ele já fez.

Como acontece com qualquer jogo popular, é evidente que Medal of Honor teve diversas continuações. No ano 2000 saiu Medal of Honor: Underground e no ano de 2002 foram dois títulos – Medal of Honor: Allied Assault e Medal of Honor: Frontline. E é neste ano que temos um momento importante que volta as atenções deste artigo para seu verdadeiro tema: Call of Duty.

Medal of Honor: Allied Assault não foi desenvolvido pelo Dreamworks Interactive (que em 2002 passou a se chamar EA Los Angeles), mas sim por outro estúdio da EA, o 2015, Inc. Usando o know-how de seus parceiros e trazendo novas ideias, essa outra equipe de desenvolvedores conseguiu levar a série para novos patamares de sucesso.

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Problemas durante o desenvolvimento do Allied Assault e a decisão da EA de tirar Medal of Honor das mãos do 2015, Inc. – mesmo com o jogo fazendo sucesso – resultaram em diversos funcionários do estúdio abandonando a EA para trabalhar com a produtora que era sua principal rival na época, a Activision. Assim nasceu o estúdio Infinity Ward.

O “Medal of Honor Killer”

Quando a Activision resolveu investir nos talentos por trás do sucesso de Medal of Honor: Allied Assault, não era segredo que a produtora queria criar um competidor direto para o FPS de guerra bem-sucedido de sua principal competidora da época, a EA.

Grant Collier e Vince Zampella saíram juntos do 2015, Inc para formar uma sociedade com Jason West e fundar o estúdio Infinity Ward logo em 2002. Um total de 22 ex-funcionários do 2015, Inc acompanharam seus colegas nessa nova empreitada. 

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Observando essa oportunidade, a Activision investiu US$ 1,5 milhão no estúdio, em troca de 30% de suas ações e da promessa de criar um “matador de Medal of Honor”. Essa não é uma força de expressão, esse era exatamente o codinome do primeiro Call of Duty, antes dele ganhar seu título oficial:

“Nós estávamos buscando uma franquia que faria sucesso em toda a Europa e Estados Unidos. E o gênero de tiro na Segunda Guerra era o escolhido. O projeto realmente se chamava MOH Killer até um nome oficial ser encontrado”, declarou Justin Thomas para o site MCV UK, um artista que trabalhou para a Infinity Ward na época.

O valor oferecido pela Activision na época era um investimento considerável para se fazer um jogo. O estúdio também teve total liberdade criativa, e o resultado foi o primeiro Call of Duty, lançado originalmente no PC em 29 de outubro de 2003.

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A nova franquia estreou com grande sucesso. O Call of Duty original tem uma média de 91 no Metacritic e, no ano de seu lançamento, foi o oitavo jogo mais vendido dos Estados Unidos, segundo o NPD Group.

O jogo se destacava pelo cuidado que a Infinity Ward teve especialmente com a inteligência artificial dos NPCs, que resultou em novas interações tanto com os inimigos como com aliados, que agiam de maneira mais natural como membros do seu esquadrão. O jogo foi regado de elogios e prêmios, incluindo jogo do ano no Interactive Achievement Awards (atualmente conhecido como prêmio D.I.C.E.) e o prêmio de “Estúdio Novato do Ano” para a Infinity Ward no Game Developers Choice Awards de 2004.

Um sucesso menor do que esse já seria suficiente para garantir uma continuação ao novo projeto do estúdio Infinity Ward. A parte mais interessante de Call of Duty 2 é que o game marcou a estreia da franquia nos consoles. Aproveitando sua proximidade com a Activision e com a franquia nos PCs, a Microsoft ofereceu um contrato para o segundo jogo ser um dos títulos e lançamento do Xbox 360 – e assim foi.

Call of Duty 2 fez sua estreia em outubro de 2005 nos PCs e, logo depois, em 22 de novembro do mesmo ano no Xbox 360.

A aposta de levar CoD aos consoles se mostrou muito correta. Além do jogo vender mais que o seu antecessor, o NPD group estimou que 77% dos compradores do Xbox 360 também compraram o segundo CoD na época do hype. A informação vem de uma página arquivada do IGN das antigas.

Com tanto sucesso é evidente que a Sony não quis ficar de fora – desde o terceiro game da franquia, Call of Duty nunca mais ficou de fora do PlayStation. Vale ressaltar até que o primeiro jogo, originalmente lançado apenas no PC, ganhou uma versão para os consoles em 2009, chamada Call of Duty Classic. Assim, o único CoD que ficou de fora do PlayStation em todos esses anos foi o segundo (não confundir com o spin-off Big Red One, que saiu no PS2).

Vamos falar de números

Dizer que um jogo “fez muito sucesso” é um tanto vago, então vamos conferir alguns números para enfatizar o que significa chamar Call of Duty de um grande tubarão branco dos games – fenômeno de certo modo começado por Steven Spielberg.

É um tanto complicado falar de rankings de número de vendas de franquias de jogos, porque pode ser um tanto vago o que se considera parte dessa franquia. Para garantir a credibilidade dos números, vou usar como base os dados reunidos pelo pessoal do Business Insider.

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O site coloca Call of Duty como a segunda franquia de jogos mais vendida na história, com um total de 400 milhões de unidades distribuídas. Os jogos ficam atrás somente de Tetris, uma série pelo menos 20 anos mais antiga do que CoD e que acumulou um total de 496,4 milhões de títulos vendidos.

É importante ressaltar que na terceira posição vem Super Mario, com 387,7 milhões de jogos vendidos no mundo todo, mas contando apenas os games com “Super” no nome. Incluindo todos os jogos Mario já feitos, a franquia salta disparado para o primeiro lugar, com mais de 740 milhões de unidades distribuídas.

Uma estratégia “clássica” de CoD que ajuda muito com esses números – e a maioria dos leitores certamente conhece – foi a prática da Activision de produzir um ou mais jogos da série por ano. Desde Call of Duty 2, em 2005, tem CoD todo ano. No momento em que este artigo é escrito, ainda não tivemos a revelação oficial da edição 2023 da série, mas parece que teremos um novo Modern Warfare chegando em novembro. Vai ser o vigésimo jogo da franquia principal, sem contar os spin-offs.

Abaixo, você confere um gráfico organizado pelo Statista, com os 10 jogos mais vendidos da série Call of Duty, com base em dados do VGChartz.

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Call of Duty no PlayStation

Não é segredo que a Sony lutou com unhas e dentes  para barrar a aquisição da Activision Blizzard pela Microsoft. Grande parte dos argumentos da dona do PlayStation focaram em Call of Duty, um dos jogos mais vendidos em todas as gerações dos consoles.

Em determinado momento, neste ano, Jim Ryan, o chefe da divisão do PlayStation, chegou a declarar que o PlayStation nunca se recuperaria de uma versão pior do CoD na plataforma, em relação ao lançamento no Xbox. Falando com a autoridade regulatória de mercado do Reino Unido, a CMA, o executivo disse:

“Nossos jogadores desertariam nossa plataforma aos montes, e efeitos da rede iriam exacerbar o problema. Nossos negócios jamais se recuperariam.”

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A fala de Jim Ryan veio para corroborar projeções próprias da CMA, que divulgou em dezembro de 2022 uma pesquisa apontando que 15% dos jogadores do PlayStation poderiam migrar para o Xbox se CoD se tornasse exclusivo para o lado verde da força.

Contestando essa pesquisa e antes mesmo da fala do chefe do PlayStation, o pessoal do Xbox encomendou uma pesquisa própria, com uma empresa terceira chamada YouGov. A conclusão dessa outra pesquisa é que apenas 3% dos jogadores do console da Sony fariam a migração, caso Call of Duty se tornasse exclusivo.

A Microsoft usou essa pesquisa para argumentar que não faria sentido comercial deixar CoD de fora do PlayStation. Apenas 3% dos jogadores não seria um número relevante o suficiente para atrapalhar o concorrente, enquanto perder o número de vendas da outra plataforma diminuiria muito os lucros da franquia.

A suposta preocupação com uma possível (ou não) exclusividade de Call of Duty fica ainda mais complicada com uma outra fala de Jim Ryan que já se tornou infame: “não quero um novo contrato de Call of Duty. Eu só quero bloquear sua fusão”, teria dito o executivo para Bobby Kotick, CEO da Activision Blizzard.

É ainda mais difícil falar de especulações e conjecturas quando não temos muitos números concretos e oficiais sobre o desempenho de CoD nas diferentes plataformas. Para a sorte de quem busca informações e azar de quem prefere não divulgá-las, um documento da Sony mal rasurado acabou revelando alguns desses números confidenciais.

Como parte de sua luta para bloquear a aquisição da Activision Blizzard, a dona do PlayStation disponibilizou documentos informando alguns dos números que CoD conquistaria em seus consoles. Esses valores foram rasurados para não aparecer na digitalização pública, mas ainda dá para reconhecer alguns deles. Os números abaixo, então, vêm do entendimento do The Verge dessas rasuras.

Call of Duty teria rendido US$ 800 milhões para o PlayStation em 2021 somente nos Estados Unidos. No mundo todo, o valor saltaria para US$ 1,5 bilhão. Mas esse é o número básico de vendas, e menos importante. Ainda segundo o documento, CoD renderia US$ 13,9 (ou 15,9) bilhões ao ano em gastos continuados dos jogadores, como com a compra de assinaturas, serviços, itens e acessórios.

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O documento aponta que possivelmente mais de 14 milhões de jogadores do PlayStation teriam passado 30% do seu tempo no console jogando CoD em 2021. Um milhão desses jogadores teria aproveitado apenas os games da série no PlayStation naquele ano. Outro dado interessante é que os jogadores que passaram mais de 70% de seu tempo jogando CoD no PlayStation, teriam acumulado uma média de 296 horas com a franquia no mesmo ano.

Desenvolvimentos recentes na novela da aquisição da Activision Blizzard nos levam a crer que a aquisição pela Microsoft realmente vai ser completada. Os jogadores de CoD no PlayStation, entretanto, não têm muito a se preocupar.

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As declarações e os fatos indicam que Call of Duty deve permanecer na plataforma por tempo indeterminado, provavelmente por bons anos depois dos dez primeiros definidos no acordo atual com a Microsoft. Enquanto o Phil Spencer estiver à frente do Xbox, também é difícil de imaginar que veremos qualquer conteúdo exclusivo de CoD deixando o PlayStation de fora.

No fim das contas, temos muito pouco a ganhar ou perder em rinha de milionário. Com os jogos passando dos R$ 350 no lançamento, nossa preocupação maior deve ser em como conseguir o dinheiro para comprá-los, não tanto em quem vai lucrar mais com suas vendas.