Dustborn: vale a pena?
Embora aposte em temas contemporâneos, jogo sofre com o ritmo arrastado
A narrativa de um game ganhou ênfase nos últimos anos com títulos que se preocupam com uma jogabilidade viciante e uma história envolvente. Com isso, a popularidade de games narrativos aumentou e se consolidou com os projetos da Telltale (The Wolf Among Us, The Walking Dead) Quantic Dream (Detroit: Become Human) e, porque não, Supermassive (The Dark Pictures).
Nessa empreitada, o estúdio Red Thread Games, em parceria com a Quantic Dream, lançou sua tentativa em entrar neste universo com Dustborn. Contudo, o estúdio parece tentar conciliar o foco narrativo com outros elementos e acaba deixando todas as mecânicas muito superficiais, inclusive a própria história.
Com uma premissa muito interessante através do “setup do universo” e uma direção de arte ousada, o game se perde com um enredo sem poder, mecânicas desnecessárias e personagens rasos para dramas que exigiam mais.
Uma jornada de autoconhecimento
Dustborn narra a história de Pax, Sai, Theo e Noam, um grupo de Anomals – nome dado aos humanos com capacidades especiais de usar palavras para manipulação de ações e sentimentos – em busca de um lugar onde possam ser aceitos.
A jornada começa em um ritmo acelerado porque a equipe está fugindo de agentes federais após roubar dados de uma megacorporação que garantirão dinheiro o suficiente para o estabelecimento de uma vida nova na terra da Nova Escócia. O problema é que eles terão de viajar pela estrada, fingindo ser uma banda de punk rock até chegar à Terra Prometida.
Ambientado em um Estados Unidos distópico alternativo e dominado pelo fascismo e autoritarismo, o game aposta em temas de identidade, autoconhecimento, liberdade e muita política. São temas relevantes e muito contemporâneos, mas tratados de modo tão escrachados que se tornam caricaturas por si só.
Ao longo da história, o jogador percebe que os personagens assumem esteriótipos tão definidos que suas personalidades são rasas. Por exemplo, Theo que tenta bancar o líder do grupo mesmo sem ter poderes, assume uma postura de protetor, algo que acontece repetidas vezes em um contexto onde ele não é tão próximo dos parceiros.
Faça suas escolhas
Assim como os jogos da Quantic Dream e Telltale, Dustborn é um game de escolhas e consequências. Cada linha de diálogo pode gerar uma situação diferente, criando oportunidades ou fechando portas. O sistema de ramificação é bem interessante porque há uma boa variedade de possibilidades.
No controle de Pax, o jogador pode escolher seus poderes para manipular os sentimentos. No entanto, isso poderá causar desconfiança no futuro. Também é possível tentar usar apenas argumentos para existir um vínculo de diálogo, mas o resultado pode não ser tão favorável. De um jeito ou de outro, as escolhas geram consequências reais para o grupo e para o mundo ao redor.
As decisões também afetarão os relacionamentos entre a equipe e aqui se encontra um grande problema em Dustborn: é difícil se importar com cada um dos companheiros. A história de cada um até cria uma conexão com o jogador por causa das dificuldades, mas a direção é muito cadenciada e os muitos textos incham a experiência com situações monótonas.
Uma comparação simples é com The Wolf Among Us. No jogo, também existem muitos diálogos, mas sempre há uma sensação de avançar no mistério. Dustborn passa uma impressão que roda em círculos. Os personagens tratam temas e, poucos momentos depois, estão batendo na mesma tecla.
Uma jogabilidade diferente
Como dito anteriormente, a equipe de Pax se passa por uma banda e, assim como os jogos de Guitar Hero com Quick Time Events, o título também tem momentos assim. Surpreendentemente, as canções são muito boas e a dificuldade até equilibrada. Não vá achando que vai ser fácil apertar os botões nos tempos certos.
Se as músicas e estes momentos dão certo, o mesmo não pode ser dito dos combates. Há trechos específicos que o título assume características de ação/aventura com a Pax usando uma guitarra para bater nos inimigos. Bem, não precisava. Ela até consegue usar habilidades, mas o jogador pode simplesmente apertar o quadrado para vencer os adversários que fica tudo bem.
Vale destacar que estes dois aspectos são em trechos específicos do game. Numa campanha de 15 horas, o que mais acontece é o simples andar para encontrar itens ou conversar com pessoas. Estamos falando de um jogo narrativo e justamente o foco é o contar sua história.
Estiloso à beça
Se as músicas são um acerto, a direção de arte é outro. Dustborn quer mostrar que justamente é um jogo narrativo e ele apresenta a história como se fosse uma HQ. Ao final de cada capítulo, o jogador vê os principais momentos como se estivesse lendo uma história em quadrinhos.
Durante o gameplay, é possível notar as palavras grandes destacadas, o uso de cores fortes, traços muito bem desenhados e outras características próprias das HQs. Inclusive, o próprio visual do game lembra esse gênero, causando uma sensação descolada e divertida.
O visual cartoon não gera uma impressão infantil, mas entrega uma arte capaz de simular a experiência de histórias em quadrinhos. As palavras destacadas se encaixam muito bem e o resuminho ao final de cada etapa gera no jogador o sentimento de construir a sua própria história.
Dustborn: vale a pena?
É difícil recomendar Dustborn diante de um catálogo com propostas mais fortes e melhor estabelecidas. Embora ele tenha um universo muito específico, o ritmo monótono e a dificuldade de criar laços com os personagens deixam a experiência em uma cadência nada envolvente.
O game tem seus acertos, como as canções e a direção de arte que agradam aos ouvidos e olhos, mas é pouco diante de toda a jornada que o jogador precisa superar. Não é um jogo ruim, mas com certeza, não é bom o suficiente para se destacar.
Veredito
Vantagens
- Direção de arte bonita
- Músicas divertidas
Desvantagens
- Temas narrativos desperdiçados
- Personagens chatos
- Ritmo arrastado e muito cadenciado
- Mecânicas de jogabilidade desnecessárias