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Liberdade criativa, Abby e adaptação de The Last of Us Part II: Neil Druckmann detalha 2ª temporada

Showrunner da aclamada adaptação da HBO revela inspirações e desafios por trás do projeto

por André Custodio
Liberdade criativa, Abby e adaptação de The Last of Us Part II: Neil Druckmann detalha 2ª temporada

A segunda temporada de The Last of Us, da HBO, estreia em 13 de abril, a apenas algumas semanas de distância. Antes do lançamento, Neil Druckmann, chefe da Naughty Dog e cocriador da série, abriu o jogo em uma entrevista exclusiva à Game Informer.

Ele abordou os desafios de adaptar videogames para a televisão, suas experiências na direção de episódios, os paralelos com o mundo real e as polêmicas vazamentos de The Last of Us Part II em 2020.

A evolução da narrativa de The Last of Us

Druckmann reflete sobre os primórdios da franquia. Quando desenvolveu The Last of Us Part I, ele não sabia se teria outra chance de dirigir um jogo, então buscou criar uma história completa, com início, meio e fim, capaz de se sustentar sozinha.

Já a sequência exigiu um esforço diferente, com a equipe buscando um conceito que ampliasse os temas originais e aprofundasse a jornada dos personagens, mantendo a independência narrativa.

“Com Part II, não sabíamos se haveria outra oportunidade, então demos um fim definitivo, mas com ecos do primeiro jogo”, explica. Esse mesmo cuidado se reflete na série. Desde a primeira temporada, a equipe plantou sementes para o futuro, aproveitando o fato de já conhecerem os eventos do segundo jogo.

The Last of Us
Fonte: HBO

Com a aprovação da segunda temporada de The Last of Us, eles mapearam o restante da história, conectando os pontos e expandindo o que veio antes.

A garantia de múltiplas temporadas para adaptar Part II abriu novas possibilidades; e a equipe agora pode se dedicar a explorar desvios narrativos, aprofundar histórias de fundo e desenvolver os personagens com mais calma.

A decisão de estruturar a temporada em sete episódios, por exemplo, não veio de ordens externas, mas de uma análise cuidadosa da trama. “Olhamos a história que queríamos contar, e o sétimo episódio será o ponto de ruptura natural”, diz Druckmann. Esse espaço criativo, segundo ele, é fruto da confiança depositada pela HBO e pela PlayStation nas escolhas da equipe.

Druckmann aprimora sua direção

A experiência de Druckmann como diretor também amadureceu. Na primeira temporada, ele estreou na televisão com certa insegurança, temendo não estar à altura do talento ao seu redor. “Eu temia ser o elo fraco em meio a tanto talento”, confessa.

O sucesso daquele episódio, combinado ao trabalho com profissionais como a diretora de fotografia Ksenia Sereda, trouxe uma nova confiança. Para a segunda temporada, ele já começou com mais segurança, entregando takes e atuações que considera especiais. “Dessa vez, começamos com o pé no chão, com ótimos takes e atuações. Acho que criamos algo especial”, adianta.

The Last of Us
Fonte: Reprodução

Adaptar The Last of Us Part II para a TV exige equilibrar a essência do jogo com as demandas do novo meio. Nos jogos, a captura de desempenho permite ajustes após as gravações, mas na televisão o que se filma é definitivo, com raras exceções para efeitos visuais, o que demanda um planejamento mais rigoroso.

Mesmo assim, Druckmann vê semelhanças nos dois processos. Trabalhar com atores, criar storyboards e definir a direção de arte são elementos que atravessam ambas as mídias, pois, como ele destaca, “arte é arte”.

Equilíbrio entre fidelidade e criatividade

A liberdade para alterar o material original sempre esteve presente. Na primeira temporada de The Last of Us, a equipe priorizou os personagens e o drama, evitando ação desnecessária, uma abordagem que se mantém agora.

O episódio de Bill e Frank, por exemplo, trocou a ação do jogo por uma narrativa mais profunda, focada em temas. Na segunda temporada, esse olhar persiste, com a equipe analisando os temas do jogo, decidindo o que transmitir pelos personagens e ajustando o que funciona melhor na televisão.

Isso inclui colocar figuras conhecidas em cenários inéditos, revelando facetas novas que enriquecem a experiência tanto para novatos quanto para fãs dos jogos de The Last of Us.

The Last of Us
Fonte: Reprodução

Escolher Kaitlyn Dever para interpretar Abby, uma personagem pivotal e polêmica, foi um processo natural. Druckmann a conhece há anos, desde quando ela quase viveu Ellie em um filme cancelado e participou de Uncharted 4. Para ele e Craig Mazin, cocriador da série, o talento veio em primeiro lugar.

Cientes das reações intensas que Abby provoca — a atriz Laura Bailey enfrentou hostilidade em 2020 —, eles discutiram o papel abertamente com Dever, que se mostrou entusiasmada. “Ela é fã dos jogos e ficou animada. Abby é complexa e essencial à trama”, afirma.

Na série The Last of Us, a imponência física da personagem dá lugar a uma força de personalidade, já que o foco está em como ela enfrenta os conflitos, não em igualá-la a outras figuras.

O desafio de um novo apocalipse

A decisão de substituir os esporos por uma rede de Cordyceps, iniciada na primeira temporada, segue moldando os infectados. A segunda temporada trará ameaças inéditas, como um Stalker com inteligência peculiar que coloca Ellie em situações de risco diferentes do jogo.

Na televisão, a credibilidade das ações ganha peso extra, e a equipe busca evitar repetições, elevando a tensão de forma orgânica e realista.

A religião, um pilar narrativo em The Last of Us Part II, não será deixada de lado. Em um mundo pós-apocalíptico, as pessoas naturalmente buscam algo em que se apoiar, e os Serafitas terão seu espaço na história, embora Druckmann mantenha o mistério sobre como.

The Last of Us
Fonte: Reprodução

Já Seattle, que no jogo funciona quase como um personagem, ganha vida em Vancouver, com sets impressionantes criados por uma equipe de arte talentosa. “A cidade tem locais icônicos, e nossa equipe de arte criou sets impressionantes. É um privilégio ter tantos recursos e talentos”, elogia.

O peso emocional que reflete o mundo real

A nova temporada de The Last of Us herda o peso emocional do jogo, explorando temas como ódio e justiça que encontram eco em conflitos reais, como guerras e perdas pessoais. Druckmann não se intimida com possíveis reações do público. Ele lembra de um fã que, em um momento de depressão e pensamentos suicidas, encontrou alento no jogo.

“Ele me disse que o jogo o ajudou a superar depressão e pensamentos suicidas. Histórias assim refletem a realidade e ajudam”, recorda. Para ele, o essencial é servir à história: o que ela exige fica, o que não exige sai, sem espaço para excessos gratuitos.

Sem a interatividade do jogo, a série aposta nas vantagens da televisão, como mudar perspectivas, dar voz a personagens secundários e usar a câmera para criar tensão. Pedro Pascal e Bella Ramsey, interpretando Joel e Ellie, entregam atuações ainda mais profundas na segunda temporada de The Last of Us, beneficiados pelo conforto com seus papéis.

The Last of Us
Fonte: Reprodução

A trama se expande além de Jackson, mostrando as consequências da primeira temporada em um escopo maior. “Exploramos o amor em diferentes facetas. O que você faz quando alguém fere quem você ama? Até onde vai por justiça?”, questiona Druckmann.

Violência mais realista, mas cuidadosa

A violência, mais realista na série, requer um cuidado especial para não afastar o público. Cada cena de ação precisa impulsionar a história ou os relacionamentos, nunca existindo apenas pelo impacto.

Quanto aos vazamentos de 2020, que revelaram a cena mais impactante de The Last of Us Part II, Druckmann se mostra indiferente após anos lidando com esse tipo de situação. “Já passei por tantos que parei de me preocupar. Não controlo as reações. Meu foco é criar algo de que nos orgulhemos”, diz.

As mudanças na adaptação nascem de um trabalho conjunto com Mazin e Halley Gross, revisitando o material com mente aberta e plantando sementes para o futuro desde a primeira temporada. A música, tão marcante em Part II, continua essencial, sempre ligada ao mundo ou aos personagens, nunca apenas decorativa.

Druckmann encerra com um tom de expectativa. “Estou animado para ver como os fãs, novos e antigos, reagirão às semelhanças e diferenças. Adorei esse debate na primeira temporada e mal espero pelo que vem agora.” A promessa é clara: uma jornada intensa, fiel ao coração de The Last of Us, mas reinventada para brilhar na tela.