A História da Decima Engine e a colaboração entre Guerrilla Games e Kojima Productions
Uma parceria inesperada que transformou o futuro de ambos os estúdios
Cada pessoa pode apontar diferentes méritos ou deméritos em Horizon Zero Dawn e Death Stranding baseado na própria experiência. Porém, alguns de seus triunfos são, definitivamente, unânimes: cenários belíssimos e qualidade técnica excepcional, deixando-os entre o topo dos jogos mais bonitos do PlayStation 4. Além de suas incríveis direções de arte, grande parte disto se deve a um fator em comum: a poderosa “Decima Engine”.
Resultante da inusitada relação com a Kojima Productions, o motor de jogo da Guerrilla Games ganhou um salto inesperado nos últimos cinco anos, mas o que isso significa para esses jogos? Aqui, veremos como essa colaboração surgiu e de que forma seus avanços aprimoraram a tecnologia de Horizon Forbidden West.
Antes de começar, uma pequena definição para quem não a conhece: motor de jogo (game engine) se trata do software (programa) utilizado para o desenvolvimento de jogos, possuindo, além de um motor gráfico para renderizar os visuais, a capacidade de simular a física, sons, animações, inteligência artificial e muitas outras funções. Em suma, o pacote completo necessário para criar jogos complexos.
O lado holandês
Desde a sua formação em 2003, a Guerrilla Games, situada em Amsterdam – Países Baixos, desenvolve seu próprio motor de jogo com base nas necessidades de seus títulos. Tendo dedicado uma década à franquia Killzone, o estúdio designou suas ferramentas a experiências de tiro em primeira-pessoa estritamente lineares com ação frenética, sempre tendo um domínio geral sobre os atos do jogador do ponto A ao B. Afinal, não havia muito o que fazer além de explodir os exércitos dos Helghast – o que já era o suficiente para divertir.
Segundo Leszek Szczepański, programador de jogabilidade, o motor de Horizon Zero Dawn, Forbidden West e Death Stranding possui suas raízes no código-fonte de Shellshock: Nam ’67 (2004) e de Killzone (2004), os primeiros jogos da Guerrilla Games. Em outras palavras, ele se trata da culminação dos anos de esforços com estes jogos de tiro e, de certo modo, representa a história do estúdio como um todo. Porém, até 2016, como dito pela co-diretora geral Angie Smets, o motor de jogo não tinha um nome: era apenas conhecido como “engine da Guerrilla Games”.
Apesar disso, é incorreto afirmar que se trata do “mesmo” motor, pois, além de ter recebido aprimorações drásticas a cada geração, uma mudança radical ocorreu em 2011 com a conclusão do desenvolvimento de Killzone 3. Fora a necessidade de preparar a tecnologia para o PlayStation 4, o estúdio decidiu dividir-se em duas equipes para produzir dois jogos diferentes. Essa foi uma decisão similar à da Naughty Dog, que em 2009 se dividiu para trabalhar em Uncharted 3 e The Last of Us simultaneamente. Killzone, sendo uma franquia de sucesso, deveria continuar, mas parte da Guerrilla Games desejava explorar novos horizontes.
Este segundo era o projeto Horizon, um jogo completamente diferente dos anteriores e um enorme desafio para toda a equipe. Portanto, foi necessário remodelar severamente as ferramentas da engine para suportar a estrutura de mundo aberto, assim como novos sistemas para os elementos de RPG, inteligência artificial, ciclo de dia e noite, múltiplas quests, entre diversos outros aspectos que seriam abordados pelo estúdio pela primeira vez. Dessa forma, surgiu o que conhecemos como Decima Engine, mas ela ainda não havia sido nomeada e muito menos chegado em sua forma ideal.
Apostar inteiramente numa proposta e num gênero completamente novos era muito arriscado, portanto, a maioria foi designada à criação da sequência de Killzone que seria um título de lançamento do PlayStation 4. Killzone: Shadow Fall não possui um mundo aberto, porém, a Guerrilla deu seus primeiros passos ao modelo com os cenários não-lineares (open ended), uma experiência importantíssima para o progresso da engine. Houve uma grande preocupação em torná-la flexível para evitar que contratempos atrapalhassem o desenvolvimento, como dito pelo diretor de tecnologia Michiel Van Der Leeuw em entrevista ao canal Noclip.
Quando estávamos desenvolvendo Shadow Fall, já estávamos criando Horizon em paralelo. Aumentamos o espaço, pois sabíamos que teríamos que criar um mundo aberto, tudo tinha que ser maior e ali começamos esses experimentos. Parte do código de Shadow Fall já suportava largos mundos abertos, mas não foi realmente utilizado. Então, é o exato mesmo motor. – Michiel Van Der Leeuw (Noclip)
O tempo mostra como essa adaptação não foi fácil para a Guerrilla. Desenvolver Killzone: Shadow Fall era necessário por diversos motivos, entretanto, sua equipe ansiava por algo novo após 10 anos ininterruptos com a franquia. Horizon Zero Dawn foi iniciado em 2011, mas foi apresentado ao público quatro anos depois, durante a E3 2015. Ainda assim, com o passar dos anos, a tecnologia do estúdio não apenas progredia belamente, como também se mostrava cada vez mais versátil.
Em 2010, a Supermassive Games iniciou o desenvolvimento de um jogo de horror em parceria com a Sony: Until Dawn. Tendo um foco narrativo e com jogabilidade em primeira-pessoa, ele seria um exclusivo do PlayStation Move, o acessório de movimento do PlayStation 3. Porém, devido a problemas no desenvolvimento e à insatisfação de seus criadores, o projeto foi retrabalhado para o PlayStation 4, o que também motivou a mudança do motor.
Apesar de não ter firmado uma colaboração propriamente, a Guerrilla Games, sendo um estúdio da Sony, compartilhou sua engine, o que tornou possível a produção da versão final de Until Dawn. Utilizar a tecnologia de Killzone ofereceu diversas vantagens, mas a Supermassive Games teve dificuldades ao construir a iluminação para um jogo de horror constantemente escuro. Felizmente, a equipe superou os obstáculos e o finalizou em 2015, também desenvolvendo Until Dawn: Rush of Blood (2016), um rail shooter para o PlayStation VR.
Além disso, a Guerrilla Cambridge, antes SCE Studio Cambridge (MediEvil) que foi reestruturado em 2010 como um estúdio-irmão da Guerrilla Games para a produção de Killzone: Mercenary (2013) para o PSVita, utilizou a engine para criar RIGS: Mechanized Combat League, um jogo de tiro competitivo para o PSVR. O estúdio foi fechado em 2017.
O lado japonês
Enquanto a Guerrilla dava os passos mais importantes no desenvolvimento de Horizon Zero Dawn, em 2015, os olhos da indústria se fixavam no outro lado do mundo.
Hideo Kojima, um dos desenvolvedores mais célebres da história, estava deixando a Konami após quase 30 anos na empresa. Resultante de tensões crescentes ao longo dos anos, essa conturbada separação provocou problemas no desenvolvimento de Metal Gear Solid V: The Phantom Pain e no trágico cancelamento de Silent Hills, um dos jogos mais aguardados de sua época devido ao envolvimento Kojima, o cineasta Guillermo Del Toro e o ator Norman Reedus e, é claro, ao enorme sucesso de P.T. (Playable Teaser) em 2014.
A gigante japonesa não estava mais interessada em grandes títulos de alto orçamento: seu novo foco era produzir jogos mobile de baixo custo e grande retorno financeiro através de microtransações, além de investimentos locais em máquinas de pachinko. Manter estúdios como a Kojima Productions não fazia mais sentido para a Konami.
Com isso, após o lançamento de Metal Gear Solid V em setembro de 2015, a Kojima Productions foi desformada e deixada com ‘nada’, pois toda a sua tecnologia, como a FOX Engine, e Propriedades Intelectuais em que trabalhou permaneceram como posses da Konami. A empresa continuou utilizando o motor em pachinkos de Metal Gear Solid 3 (2016), em Metal Gear Survive (2018) e em Pro Evolution Soccer até 2020, deixando-o completamente de lado após adotar a Unreal Engine para eFootball 2022, um dos maiores fracassos de 2021.
Após essa saída desconfortável, vários integrantes da Kojima Productions decidiram continuar com Hideo Kojima, o que o motivou a fundar o estúdio novamente de forma independente em dezembro de 2015. No entanto, isso não era tudo: graças à excelente relação com a Sony, cultivada desde 1998 com Metal Gear Solid para o PlayStation, uma parceria seguida de um grande anúncio para a produção de um novo jogo foi formada. Hideo recebeu diversas ofertas e expressou sua gratidão a isso, mas escolheu o que lhe transmitia mais confiança.
Pensei que tinha perdido tudo, mas percebi que eu tinha muitas conexões como o pessoal da Sony, Norman Reedus, Geoff Keighley (apresentador do evento The Game Awards)… Eu realmente queria me reconectar a essas pessoas que penso que me foram muito importantes. – Hideo Kojima (The Game Awards 2019)
A recepção não poderia ter sido melhor. Logo em janeiro de 2016, Hideo se juntou a Mark Cerny – desenvolvedor e produtor de jogos desde 1982 e arquiteto do PlayStation 4 e 5 – para uma viagem que eles chamaram de “tech tour”. O objetivo era encontrar a melhor tecnologia possível para produzir o primeiro título da Kojima Productions independente: Death Stranding. Mark trabalhou de perto com os estúdios da Sony para explorar a capacidade do PlayStation 4 ao máximo com seus projetos exclusivos, permitindo-o conhecer cada um deles muito bem.
A jornada durou aproximadamente duas semanas, cada dia com um estúdio diferente, realizando 15 visitas na companhia de Mark Cerny. Equipes primárias como a Sony Bend, Santa Monica, Sucker Punch e Naughty Dog, além de parceiras como a Quantic Dream, receberam Hideo e Mark com entusiasmo, apresentando suas tecnologias com centenas de slides e demonstrações, o que refletia o respeito e admiração por ambos os veteranos da indústria.
Após isso, Hideo continuou visitando estúdios conhecidos ao longo de 6 meses, totalizando 30 visitas em busca de uma engine. Com Death Stranding em mente, ele sabia exatamente do que precisava – uma tecnologia capaz de suportar a estrutura de um mundo aberto ao mesmo tempo que oferece visuais fotorrealistas, o que seria semelhante à FOX Engine no passado.
Propositalmente, Mark Cerny deixou a Guerrilla Games por último “porque sabia que havia algo lá”, como disse em entrevista à IGN. Na época, o estúdio não estava em sua melhor fase após a recepção mista de Killzone: Shadow Fall pela crítica e com os desafios da criação de Horizon, mas estava dedicado a virar o jogo. Mark sabia como nenhuma outra pessoa que essa era apenas uma complexa fase de transição.
Mesmo antes da escolha definitiva de um motor de jogo, já existia o desejo de produzir um teaser trailer para apresentar Death Stranding ao mundo na E3 2016, em junho. A Kojima Productions utilizou o estúdio de captura Visual Arts Service Group da Sony, frequentemente usado por suas equipes, e um motor que não foi especificado. Supõe-se que foi escolhida a engine da Sucker Punch Productions devido à familiaridade com mundos abertos no PlayStation 4 proveniente de inFAMOUS: Second Son (2014), mas não houve confirmação.
Dejima, o ponto de encontro
Ao chegarem na Guerrilla, Hideo e Mark foram recebidos por Hermen Hulst, hoje chefe da PlayStation Studios, que era o diretor geral do estúdio. Fora outras atividades casuais em Amsterdam, já que visita durou bem mais tempo que o previsto, eles assistiram a uma apresentação de slides de 340 páginas, elaborada por Michiel Van Der Leeuw (diretor técnico) e Jan-Bart Van Beek (diretor de arte), que detalhavam todas as ferramentas do motor em que estavam criando Horizon Zero Dawn.
Visitei muitos estúdios ao redor do mundo, conhecendo muitas pessoas excelentes – Guerrilla Games em Amsterdam: a tecnologia deles simplesmente estava quilômetros à frente de qualquer lugar. – Hideo Kojima (PlayStation Blog)
Além do fato de os recursos da engine serem totalmente favoráveis ao conceito de Death Stranding, Hideo ficou muito impressionado com a proporção de escala e nível de detalhes que ela era capaz de no hardware do PlayStation 4.
Foi então que a Guerrilla Games decidiu compartilhar o motor de jogo, porém, de um modo diferente que nem mesmo o próprio Mark Cerny já havia visto. Eles entregaram o código-fonte para a Kojima Productions em uma caixinha de presente, basicamente, sem nenhuma exigência contratual para utilizá-lo da forma como quisessem.
Conhecendo o legado de Hideo, eles refletiram que não teriam nada a perder, pois, nas palavras de Hermen Hulst, era “pelo bem de fazer jogos”, mesmo que recebessem apenas um agradecimento. Certamente, eles não esperavam que receberiam muito além disso.
Ao receber o motor, a equipe técnica da Kojima Productions fez centenas de linhas de investigação durante meses para implementar as técnicas que seriam necessárias no desenvolvimento de seu jogo. Internamente, eles criaram uma tech demo chamada “Glass Room”, uma reprodução de uma sala do estúdio para realizar experimentos com a iluminação, algo muito similar ao que fizeram nos primórdios da FOX Engine.
Ao retornarem diversos relatórios à Guerrilla Games – o que não era esperado, o estúdio holandês ficou admirado com o domínio que demonstraram sobre a tecnologia ao apresentarem novidades e melhorias significantes, o que tornou a troca de informações cada vez mais frequente até alcançar algo muito maior.
Hermen disse que percebeu uma paixão pela perfeição ao trabalhar junto da equipe técnica da Kojima Productions supervisionada por Akio Sakamoto, diretor técnico que trabalha com Hideo desde Metal Gear Solid: Peace Walker (2010), e apreciou o importante intermédio de Mark Cerny que possibilitou que esse encontro.
Nada disso teria acontecido sem o Mark. É algo único ter alguém que desenvolve o hardware, é diretor criativo e conhece todo o lado técnico de todos os estúdios [PlayStation]. – Hermen Hulst (IGN)
Dessa forma, ambos perceberam que podiam ir muito além de aprimorar apenas a base do motor. O que foi um amigável compartilhamento de tecnologia acabou formando uma grande colaboração. Todas as suas atualizações passaram a serem compartilhadas entre os estúdios, até que já fosse reconhecível que a engine estava “diferente” mesmo preservando o código-fonte. Com isso, finalmente veio a ideia de nomeá-la – esse era o começo de uma nova fase.
Para celebrar a parceria entre Kojima Productions e Guerrilla Games, decidiu-se que o nome do motor seria baseado na ilha artificial de Dejima, um grande porto construído em 1634 para trocas comerciais com portugueses, mas que passou a ser utilizado pelos holandeses a partir de 1641. Durante o Período Edo, o Japão era dominado por uma política isolacionista, tendo o porto de Dejima como a única conexão com civilizações ocidentais até seu fechamento em 1854, sendo incorporado à cidade de Nagasaki.
Trocas comerciais não representam apenas a circulação de mercadorias, mas também o intermédio cultural e tecnológico entre diferentes povos, o que aconteceu entre japoneses e holandeses em Dejima e se repetiu com a Kojima Productions e a Guerrilla Games com a Decima – uma das latinizações de Dejima por ocidentais que dá nome a uma das Parcas, as deusas do destino e do nascimento na mitologia romana (análogas às moiras na mitologia grega), dessa forma também simbolizando a criatividade, nas palavras de Hideo e Hermen.
Por um tempo, os integrantes de ambos os estúdios realizavam viagens a Tóquio e Amsterdam para trabalharem juntos com a Decima Engine presencialmente. No entanto, no final de 2016, foi decidido dar um passo além. Durante um painel dedicado a Death Stranding apresentado por Geoff Keighley na PlayStation Experience 2016, Hideo, Hermen e Mark contaram a história desse encontro e anunciaram a Kojima Productions Amsterdam, um estúdio satélite dentro da Guerrilla Games dedicado à tecnologia do motor.
Agora, estamos indo para Júpiter com cada um dos estúdios trabalhando em Horizon Zero Dawn e em Death Stranding, mas no futuro, queremos ir juntos para o espaço profundo, então estamos fazendo preparações. Por isso, estamos formando essa equipe inteiramente focada na tecnologia da Decima Engine. – Hideo Kojima (PlayStation Experience 2016)
No ano seguinte, Horizon Zero Dawn era lançado enquanto Death Stranding entrava efetivamente em sua fase de produção. Depois de anos de muito esforço, a mais nova franquia da Guerrilla teve uma recepção excelente pelo público e pela crítica, estreando como um dos jogos mais vendidos do PlayStation 4. Muitos desejos de seus desenvolvedores não vieram a se concretizar pelo fato de Zero Dawn ter sido sua primeira experiência com a estrutura de mundo aberto e sistemas de RPG, mas tudo se alinhou para que pudessem criar a melhor sequência que podiam com Forbidden West.
Não houve muito espaço para todos os aprimoramentos da colaboração, pois ela foi estabelecida poucos meses antes do lançamento de Zero Dawn. Entretanto, em homenagem, a Guerrilla Games inseriu três objetos de Death Stranding que haviam aparecido nos trailers de 2016, transformando-os em coletáveis que podem ser trocados por uma Caixa Misteriosa com uma modificação Muito Rara.
Além disso, Hideo Kojima e vários outros integrantes de seu estúdio são mencionados nos créditos de Horizon Zero Dawn e Forbidden West na seção dos Agradecimentos Especiais.
No meio do ano, Giliam de Carpentier – engenheiro técnico da Guerrilla Games – e Kohei Ishiyama – programador gráfico da Kojima Productions – realizaram uma apresentação no evento SIGGRAPH 2017 para exibir alguns dos avanços aplicados na iluminação, no espalhamento atmosférico de névoa, em soluções de antisserrilhamento (FXAA + TAA) e na otimização para o PlayStation 4 Pro. De todos esses, o que Kohei Ishiyama se dedicou a aprimorar foi a névoa, reconstruída para atender à proposta fotorrealista que Death Stranding possui de modo similar a Metal Gear Solid V e Silent Hills (qualquer semelhança é mera coincidência… quem sabe).
O vídeo abaixo demonstra essa aplicação no primeiro cenário de Death Stranding criado na Decima Engine, exibido no Teaser Trailer do Game Awards 2016. A apresentação completa – extremamente técnica – pode ser encontrada no site da SIGGRAPH 2017.
Em entrevista ao site The Next Web, em 2019, Michiel Van Der Leeuw expressou que a colaboração entre os estúdios foi “intensa”, com ambos comunicando informações diariamente. Três anos após o primeiro encontro, em janeiro, a Kojima Productions simbolicamente ‘devolveu’ a caixa com a Decima Engine para exibir uma versão de Death Stranding jogável.
Three years ago we gave @KojiPro2015_EN a copy of our @DecimaEngine in this box. Today @HIDEO_KOJIMA_EN came back to @Guerrilla to show us the incredible things he’s making with it in #DeathStranding. So impressed! pic.twitter.com/8dLpdIh1bI
— Hermen Hulst (@hermenhulst) January 15, 2019
Death Stranding
Hideo Kojima se preocupou em tornar seu jogo muito diferente de Horizon, pois não queria que os dois fossem muito similares, mas após o estudo das ferramentas da Decima, percebeu que conseguiria entregar resultados completamente distintos. Apesar de ambos os jogos terem mundos abertos, os focos criativos da Kojima Productions ajudaram a desenvolver outras partes da engine que não eram priorizadas pela Guerrilla até aquele momento.
Ao analisar Horizon Zero Dawn, a Digital Foundry descreveu a água como “uma das partes mais fracas da engine”, mas isso mudou em Death Stranding. A simulação dos fluidos foi significativamente aprimorada com a implementação do alcatrão – o líquido preto que é importantíssimo em seu mundo – e, pelo fato do jogo ter ênfase na travessia, os movimentos das correntezas dos riachos precisavam ser visíveis para que o jogador percebesse o risco de tentar atravessá-las.
Igualmente, as animações de Sam – o protagonista – receberam muitos cuidados para que fossem as mais claras possíveis, transmitindo através da linguagem corporal o seu estado ao caminhar. Sua colisão com as superfícies, plantas e outros objetos, por matéria de necessidade, é uma das mais eficientes entre os jogos de sua época.
Outro foco que difere muito Death Stranding de Horizon Zero Dawn é a importância dada ao fotorrealismo. Desde o berço da FOX Engine, o uso da fotogrametria para capturar modelos de personagens e objetos é uma das especialidades da Kojima Productions. A sua aplicação na Decima Engine auxiliou a Guerrilla Games na composição de Forbidden West, apesar de ambos terem proposta de “realidade” diferentes.
Temos prioridades similares, mas, em alguns pontos, eles [Kojima Productions] também são muito diferentes. Por exemplo, eles pensam que fotorrealismo é bem mais importante do que achamos. – Michiel Van Der Leeuw (The Next Web)
Horizon impressiona ao entregar um mundo belíssimo assumidamente fantástico, o que nas palavras de Hermen Hulst seria uma visão mais “romantizada”, se distanciando propositalmente da realidade em muitos aspectos. Em seu caso, a expressão “mais bonito que o mundo real” que alguns gostam de utilizar é muito plausível.
Observando ambos, o maior salto de Death Stranding parece estar nas expressões faciais, elogiadas em sua época como umas das melhores da indústria. Afinal, Hideo Kojima queria extrair o máximo dos atores que convocou, como Norman Reedus, Mads Mikkelsen, Léa Seydoux, Margaret Qualley, Lindsay Wagner e (o subestimado) Tommie Earl Jenkins.
Combinado a isso, temos as cutscenes (cinemáticas), uma das suas proficiências mais apreciadas desde Metal Gear Solid (1998) no primeiro PlayStation. Além do óbvio, como o uso da câmera, nota-se uma grande evolução nas técnicas de renderização com o nível de detalhes, na iluminação artificial e na amenização do pop in (objetos surgindo abruptamente na tela).
Cinemáticas é uma área em que Hideo e seu time sempre foram muito fortes, e com eles utilizando nossa tecnologia do jeito deles também fará progredir o que nós poderemos fazer no futuro. – Hermen Hulst (E3 2018)
Por ser uma engine nova para o estúdio japonês, que a usou durante 3 anos até finalizar o jogo, mais de 70 integrantes da Guerrilla Games contribuíram diretamente no desenvolvimento, sendo creditados na versão final. Assim como a Guerrilla incluiu objetos de Death Stranding, a Kojima Productions adicionou hologramas especiais de Horizon Zero Dawn, além de Hermen Hulst ter servido como modelo para um personagem do jogo.
Horizon Forbidden West
Com a chegada da aventura no Oeste Proibido, já podemos perceber o quão longe a Decima Engine pode ir. Aqui, baseado na versão de PlayStation 4, serão exemplificados alguns de seus aspectos que mais evoluíram e os frutos da colaboração entre os dois estúdios.
Começando por uma nova mecânica: o pulso do Focus/Foco de Aloy. Em Horizon Zero Dawn, o Foco era utilizado ao pressionar e soltar o botão R3, servindo para interagir com objetos dos Antigos, inspecionar máquinas e várias outras funções. Para utilizá-lo em Forbidden West, é necessário segurar o botão, pois em seu lugar foi colocado um pulso que revela objetos próximos.
Além disso, de modo muito similar ao Odradek (a “estrela mecânica” no ombro do protagonista) de Death Stranding, esse pulso destaca detalhes do terreno para Aloy, indicando através de cores onde é possível escalar (amarelo) e onde não é (vermelho). Obviamente, os detalhes fornecidos em Death Stranding são muito maiores devido à sua proposta, mas isso não impediu a Guerrilla de adaptar o recurso à sua maneira.
Tecnicamente, mesmo no PlayStation 4, Forbidden West consegue entregar resultados muito mais surpreendentes que Zero Dawn. Com a experiência dos últimos anos, seus desenvolvedores alcançaram soluções de otimização que permitem gerar densidades e definições de elementos do cenário como plantas, pedras, peças de máquinas e outros de modo ainda mais efetivo, o que permitiu o resgate de ideias que precisaram ser sacrificadas no passado (como voar sobre uma máquina similar a um pterodáctilo) e a implementação de sistemas que eram impossíveis no console.
Essa diferença é ainda mais perceptível nos personagens, seja nos principais, nos secundários e nos NPCs espalhados pelo cenário. Na verdade, esse é com toda certeza o ponto em que Horizon mais demonstrou evolução. Zero Dawn recebeu críticas que julgavam as animações dos personagens como “robóticas” ou “muito artificiais”, porém, a Guerrilla parece ter levado tudo isso muito a sério em Forbidden West.
As expressões não apenas estão muito melhores, como também comprometidas em transmitir “humanidade”, pois a maioria das cenas, até mesmo de missões secundárias, utiliza a completa captura de movimentos dos atores e técnicas de fotorrealismo na composição de seus modelos, transmitindo vida além de beleza.
O mesmo pode ser dito sobre a qualidade das cinemáticas, um dos pontos em que a Kojima Productions mais pôde contribuir. A natureza, que também apresenta animais de pequeno porte extremamente detalhados, é reativa aos movimentos de Aloy e das máquinas, permitindo que você “desenhe” ao passar sobre a grama ou espalhar as algas flutuantes na superfície da água.
Como mencionado anteriormente, a água de Zero Dawn não era um de seus pontos fortes, pois a sua presença não era significante. Entretanto, somado às implementações de Death Stranding, isso mudou completamente em Forbidden West, já que podemos explorar sessões inteiramente submersas e o cenário está repleto de correntezas e locais com mar agitado.
Os aprimoramentos são muitos – afinal, se passaram 5 anos entre Zero Dawn e Forbidden West – e certamente os jogadores descobrirão cada vez mais detalhes na medida que exploram o segundo capítulo da jornada de Aloy. Com ainda mais certeza, a Decima Engine será uma das maiores protagonistas do futuro do PlayStation 5, quem sabe até do próximo console.
Em 2021, Hermen Hulst, promovido a chefe da PlayStation Studios em novembro de 2019 (coincidentemente na data de lançamento de Death Stranding), citou a Kojima Productions como um de seus grandes estúdios parceiros. Hideo Kojima, inclusive, tinha planos de tornar Death Stranding uma franquia duradoura e que faria uma sequência, mas não direta. Ainda nesse ano, possivelmente no evento The Game Awards 2022, como sugerido pelo próprio, finalmente saberemos o que sua equipe vem preparando.
E você, o que acha que o futuro reserva para esses dois estúdios?