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As Dusk Falls: vale a pena?

Um drama interativo para os amantes de narrativas densas e que não se incomodam com um gameplay sutil

por Andrei Longen
As Dusk Falls: vale a pena?

Prepare um café, faça uma pipoca, coloque um refri para gelar e relaxe no sofá. Essa é a dica para quando você for jogar As Dusk Falls. O game é uma produção da Interior/Night, um estúdio pequeno formado por alguns ex-funcionários da Sony e da Quantic Dream, produtora dos clássicos Heavy Rain e Detroit: Become Human.

Quem logo pensou em narrativas densas, acertou em cheio. As Dusk Falls é um drama interativo que foca tudo em contar histórias, desenvolvendo e entrelaçando dilemas de personagens. E, nesse meio termo, apresentando elementos bem sutis de jogabilidade.

O jogo foi originalmente lançado em em julho de 2022 para PC e Xbox Series S|X. Ele chega agora nas versões de PlayStation 4 e PlayStation 5, com bem poucas novidades na experiência em si. Considerando isso tudo, está na hora de saber se As Dusk Falls é – ou não – para você.

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A Rota 66 não é tão tranquila quanto você imagina

Estamos no interior dos Estados Unidos, na conhecida Rota 66, bem no deserto árido do Arizona. A vida aqui é bem mais pacata e sossegada, longe da pressa e da agitação dos grandes centros urbanos. Pelo menos é o que se pensa na primeira hora de jogo. E, logo, já se está bem no meio de disputas entre duas famílias e de tiroteios entre policiais e bandidos.

As Dusk Falls conta a história de como a família Holt, historicamente conhecida na região por seus comportamentos problemáticos com a lei, se envolve com turistas que estão apenas de passagem pela cidade. Estes são os Walker, uma família tradicional de cidade grande, com suas rotinas de casa, de trabalho e de relacionamentos, mas que resolvem arriscar novos ares.

Os dois lados colidem num restaurante local, onde as relações interpessoais se tornam cada vez mais inflamáveis. No início, você nem considera que pode chegar a se envolver com a trama. Mas basta deixar alguns acontecimentos rolarem, e colocar o peso das suas escolhas morais como o norte dos desdobramentos, que a sensação de envolvimento com os personagens se torna real.

O melhor de As Dusk Falls é a narrativa

As características de personalidade dos personagens e a forma como reagem quando pressionados por alguma situação extrema da vida é o que gera uma grande identificação com A Dusk Falls. É comum sentir uma mistura de sentimentos adversos, como confiança, pena, insegurança, orgulho, superação, tristeza, alegria, culpa, raiva e até mesmo luto.

família passeia tranquila pelas estradas da rota 66 em as dusk falls

Em alguns momentos, é até possível fazer relações com certos momentos da nossa própria vida, dependendo da situação e o tipo de gatilho. Assuntos mais leves, como amor, diversão e sucesso na carreira, aparecem nas entrelinhas para apaziguar o caos de temas socialmente mais delicados, como corrupção, o desprezo de um pai por um filho ou suicídio.

O interessante é que o jogo cobre uma linha do tempo de cerca de 30 anos das consequências do envolvimento das famílias Holt e Walker, entre outros personagens coadjuvantes. Então, você acompanha de perto qual é o impacto que tal ação no passado deixou como marca na vida deles. Seja algo de construtivo ou um trauma turbulento que insiste em causar ansiedade e insônia.

personagens da família Holt de As Dusk Falls em conflito familiar

É aqui que a mágica de As Dusk Falls acontece, sendo a narrativa, com certeza, a melhor parte do jogo. Ela dura cerca de 6 a 8 horas na primeira vez em que a campanha é jogada. E é suficiente para deixar marcas e ótimas memórias. Isso, claro, dependendo do nível de relação entre o que acontece no game e a própria experiência de vida fora do jogador da telinha.

Jogabilidade interativa sutil e passiva

O forte de As Dusk Falls é a narrativa. Isso fica ainda mais escrachado na forma que a jogabilidade se apresenta. Você literalmente passa a maior parte do tempo assistindo a cenas e observando o desdobramento dos personagens. E, muito de vez em quando, aperta algum botão ou mexe nos analógicos para completar alguma ação específica.

girando o analógico para completar uma ação em as dusk falls

Com a ajuda de um cursor na tela, o jogador pode interagir com alguns objetos. É só movê-lo até lá e apertar X para executar a ação. Numa outra ocasião, é preciso apertar um parafuso com uma chave de fenda girando o analógico na direção certa. Ou, ainda, desviar de um tronco de árvore durante uma perseguição movendo o analógico rapidamente para um dos lados.

As Dusk Falls funciona basicamente assim. É claro que existem outros tipos momentos interativos, mas a essência do gameplay é essa. E, ressalta-se, ainda, que ela conta com um detalhe que pode incomodar: a passividade da mecânica. Diferente do que acontece em títulos como The Walking Dead, Life is Strange ou Until Dawn, você não pode controlar personagens livremente pelos cenários.

escolhendo opções de diálogos em as dusk falls

Aqui, é o próprio jogo que decide com qual personagem você executará uma ação, dependendo do contexto do momento e considerando todas as suas ações e escolhas anteriores que chegaram até naquele ponto. Tudo, da sequência dos fatos e eventos, acontece de forma bastante automática e contínua, em que não é possível parar para explorar os arredores.

Explore bifurcações e caminhos em As Dusk Falls

O ponto alto da jogabilidade de As Dusk Falls são as Encruzilhadas, momentos onde é preciso fazer uma escolha moral muito específica já sabendo que definirá o futuro de um personagem para sempre. As decisões aqui realmente importam e impactam no que vai acontecer mais para frente, seja em alguns minutos, meses, cinco ou 30 anos na linha do tempo.

opção de encruzilhada no jogo as dusk falls

A primeira vez que se joga é, com certeza, a que mais causa impacto, pois você não espera algumas das coisas. Não é raro ficar se perguntando: “se tivesse escolhido a outra opção, qual seria o impacto que este personagem, pelo qual agora sou tão apegado, teria tido?”

Sendo assim, As Dusk Falls oferece uma Árvore Narrativa, uma linha do tempo detalhada que mostra toda a progressão do jogador pela história. Aqui ficam as escolhas de Encruzilhadas, os caminhos percorridos e as bifurcações ainda inexplorados. A graça é revisitar certos trechos a partir de pontos-chaves e descobrir o que aconteceria numa outra possibilidade da narrativa.

árvore narrativa mostrando os caminhos e bifurcações de as dusk falls

O recurso é muito bem-vindo, pois realmente adiciona valor às diferentes conclusões para cada trecho ou capítulo rejogado. E, o melhor de tudo: revisitar esses momentos ou mesmo capítulos interiores pode aumentar a duração da aventura para mais de 15h. E isso, com certeza, é um bom fator replay.

Como curiosidade, a cada capítulo finalizado, o jogo fornece detalhes sobre a personalidade do jogador diante da sua desenvoltura. São as Percepções, insígnias que classificam suas atitudes baseadas em três campos básicos: Valor, Traço e Estilo de Jogo. No meu caso, eu tirei, com frequência e seguindo a ordem, Honra, Sincero e Reflexos Rápidos.

insígnias das percepções em As Dusk Falls

Elas significam que eu valorizei a integridade e busquei fazer o certo, criei laços genuínos com outras pessoas e concluí certas ações rápidas com velocidade e precisão. Isso recurso em nada impacta no jogo e nem concede extras. Mas foi interessante que As Dusk Falls se utilizou das nuances das minhas decisões para avaliar minha personalidade e apontar traços do meu caráter.

O que As Dusk Falls traz de novo aos consoles da Sony?

Em termos de conteúdo, absolutamente nada é novidade. Já na jogabilidade, o diferencial está mesmo na versão para PlayStation 5, que explora uma parte dos recursos do DualSense.

Aqui, você recebe uma sensação extra de que estão “sentindo” os personagens pelas movimentações deles, sobretudo em cenas com muita interação, como numa briga que derruba e quebra vários objetos. Ou, ainda, durante uma perseguição intensa, a pé, ou em uma fuga de carro.

Também é possível usar o touchpad para escorregar o cursor pela tela, interagir com objetos e escolher opções de diálogos importantes. E só: a implementação dos recursos do joystick no jogo é bastante acanhada. Definitivamente, As Dusk Falls não entra para o hall de jogos que melhor aproveitam o controle da Sony.

Gráficos estilizados em cenas estáticas

Original é a melhor forma de descrever o visual de As Dusk Falls. O jogo mistura cenas estáticas dos quadrinhos, do tipo quadro a quadro, com um estilizado gráfico que combina com a proposta.

Os personagens são propositalmente não animados, mas outros elementos espalhados nas cenas, como a chuva ou trânsito, se movem quase que normalmente pelos arredores.

pai conversa e acalma filha em As dusk falls

Assim, o jogador apenas vê as reações e expressões dos personagens já prontas e embaladas pelas falas deles, mas sem a evolução das emoções que os levaram até tal momento. Por exemplo, as bocas não se mexem continuamente durante os diálogos. Enquanto isso, o cabelo e as roupas de uma personagem pode balançar com o vento.

irmãos holt tramam planos em assalto no bar de as dusk falls

O estilo de arte de As Dusk Falls em nenhum momento tenta ser realista. A ideia aqui é realmente parecer, por vezes, uma pintura, e em outras, uma graphic novel com uma composição própria de cores saturadas e ângulos de câmera escolhidas a dedo para impactar.

O som do interior dos EUA – e com ótimas dublagens

A parte sonora de As Dusk Falls cumpre muito bem seu papel na imersão. A trilha sonora combina músicas cantadas com uma sonoplastia cheia de ruídos que ressalta a vida interiorana dos Estados Unidos. O ponto extra aqui vai para as vozes e dublagens dos personagens.

fugindo de carro pelos estados unidos em as dusk falls

Na parte em inglês, existe toda uma preocupação da Interior/Night em usar sotaques de regiões bastante específicas do país, definindo uma identificação da cultura e das formas locais de se expressar. Isso acrescenta muito na credibilidade das personalidades dos personagens na narrativa.

A parte em português brasileiro também está ótima. As interpretações são naturais e raramente parecem robóticas. Porém, os sotaques dos dubladores brasileiros não combinam os nativos do interior do Arizona. Então, às vezes, fica uma sensação um pouquinho estranha.

discussões calorosas entre personagens em as dusk falls

E, num caso específico, a voz brasileira do garotinho Ash não combina. O dublador parece ter idade maior que o personagem, tornando este trecho da história um pouco artificial. Nada disso, claro, atrapalha a experiência de As Dusk Falls, mas é perceptível.

As Dusk Falls: vale a pena?

As Dusk Falls vale a pena. Porém, sob estas condições: você precisa gostar muito de narrativas, não se importar com as tímidas possibilidades de gameplay e realmente querer se envolver com os personagens.

A intenção aqui é ser um espectador e ter uma experiência propositalmente focada em histórias. E, bem de vez em quando, faz algum movimento com os analógicos ou escolhe, com um único botão, alguma bifurcação importante entre os diálogos.

As Dusk Falls custa R$ 150 na PlayStation Store. Se você já sentiu algum tipo de receio pela proposta do jogo ou tédio se imaginando jogá-lo, talvez seja melhor nem se arriscar neste momento. Caso contrário, o entretenimento de qualidade é garantido.

Veredito

As Dusk Falls
As Dusk Falls

Sistema: PlayStation 5 | PlayStation 4

Desenvolvedor: Interior/Night

Jogadores: 1 - 8

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80 Ranking geral de 100
Vantagens
  • Narrativa densa e com personagens envolventes
  • Muitos caminhos e bifurcações para explorar
  • Escolhas morais realmente importam na história
  • Visual gráfico estilizado e com apresentação original
  • Ótimas dublagens em português
Desvantagens
  • DualSense muito pouco explorado
  • Interatividade do gameplay é muito sutil e pode incomodar
  • Campanha relativamente curta: cerca de 6h
Andrei Longen
Andrei Longen
Jornalista | Redator
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