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Faz diferença mesmo? Saiba por que mal conseguimos perceber mais que 60 FPS em jogos

Após demonstrações técnicas de taxas de quadros superiores a 400 FPS, discussões sobre a praticidade disso começaram a circular online

por André Custodio
Faz diferença mesmo? Saiba por que mal conseguimos perceber mais que 60 FPS em jogos

A taxa de quadros por segundo (FPS, do inglês “frames per second”) é um dos pilares nos games. Enquanto 60 FPS é amplamente aceito como padrão de fluidez, há um debate crescente: taxas mais altas, como 120, 144 ou até 400 FPS, fazem diferença perceptível?

Baseado em princípios científicos da física e da percepção humana, este artigo explora por que notamos quedas abaixo de 60 FPS em jogos, mas temos dificuldade em distinguir ganhos acima disso — ou muito acima, como vemos em casos mais recentes.

O básico da percepção visual e o limiar de 60 FPS em jogos

A percepção humana de movimento depende do sistema visual e do cérebro. Estudos indicam que o olho humano detecta mudanças em imagens estáticas a partir de 24 FPS — o padrão do cinema —, quando a ilusão de movimento contínuo emerge.

Esse fenômeno, chamado persistence of vision, explica por que animações abaixo de 20-24 FPS em jogos parecem travadas. Já entre 30 e 60 FPS, a fluidez aumenta significativamente.

Um estudo de 2014 publicado no Journal of Vision sugere que o cérebro processa imagens em cerca de 13 milissegundos, equivalente a 76 FPS teóricos. Isso implica que, até certo ponto, conseguimos perceber diferenças acima de 60 FPS, mas há um limite prático.

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Fonte: Nvidia

Abaixo de 60 FPS, quedas são evidentes. A 30 FPS, o intervalo entre quadros é de 33,3 milissegundos, suficiente para o cérebro registrar inconsistências, como stuttering (travamentos) ou motion blur (borrão de movimento).

Em jogos rápidos, como shooters, isso compromete a precisão e a imersão. Porém, acima de 60 FPS, os ganhos diminuem. A 120 FPS, o intervalo cai para 8,3 milissegundos, e a 144 FPS, para 6,9 milissegundos.

A diferença é sutil, e a maioria das pessoas não distingue isso conscientemente em condições normais, devido à lei de Weber-Fechner: a percepção de mudanças é proporcional à magnitude inicial, tornando incrementos menos notáveis em taxas altas.

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Fonte: Nvidia

Testes psicofísicos, como os conduzidos por Claypool (2009), mostram que a percepção de fluidez satura entre 60 e 90 FPS para tarefas visuais comuns, como seguir objetos em movimento.

O benefício é mais temporal que perceptual: cada quadro extra oferece uma janela de reação mais precisa, crucial em milissegundos. Ainda assim, para o gamer casual, o salto de 60 para 144 FPS em jogos é mais psicológico ou placebo do que fisicamente evidente.

Física do FPS: hardware e monitores

A taxa de quadros é limitada por dois fatores físicos: a capacidade da placa gráfica (GPU) de renderizar quadros e a taxa de atualização do monitor (Hz), que determina quantos quadros são exibidos por segundo.

Uma GPU como a NVIDIA RTX 4090 pode gerar mais de 400 FPS em jogos leves, como Counter-Strike 2, mas se o monitor for de 60 Hz, apenas 60 quadros serão exibidos, desperdiçando o excedente ou causando screen tearing (rasgos na imagem).

Monitores de 144 Hz ou 240 Hz são necessários para aproveitar taxas mais altas, mas mesmo assim, a percepção humana atinge um plateau.

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Fonte: Activision

O frametime — tempo necessário para renderizar cada quadro — também importa. A 60 FPS, o frametime ideal é 16,7 milissegundos. Quedas bruscas (de 60 para 30 FPS em jogos, por exemplo) aumentam esse valor, criando inconsistências perceptíveis.

Já a estabilidade acima de 60 FPS, como entre 120 e 144 FPS, reduz o frametime em incrementos mínimos, que o cérebro raramente registra como melhoria significativa fora de contextos específicos, como competições.

O custo das taxas mais altas: placas gráficas e mercado

Alcançar 400 FPS exige hardware de ponta. A RTX 4090 custa cerca de R$ 14.000 no Brasil, enquanto a AMD RX 7900 XTX, concorrente direta, sai por R$ 8.000. Essas GPUs entregam taxas exorbitantes em jogos otimizados, mas o investimento é questionável.

Em títulos AAA, como Cyberpunk 2077 com ray tracing, mesmo essas placas mal atingem 100 FPS em 4K. Já em Esports, onde 400 FPS é viável, monitores de 360 Hz ou 540 Hz (e.g., ASUS ROG Swift Pro PG248QP) custam entre R$ 5.000 e R$ 7.000.

O custo total pode superar facilmente os R$ 15.000, algo inacessível para a maioria dos consumidores.

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Fonte: Nvidia

Comparativamente, uma RTX 3060 (R$ 2.000) entrega 60-120 FPS em jogos modernos com ajustes, e monitores de 144 Hz custam R$ 1.500. Para o jogador médio, essa faixa é suficiente, levantando a questão: vale pagar cinco vezes mais por ganhos que mal percebemos.

Dados de mercado mostram que apenas 10% dos jogadores no Steam (2024) usam monitores acima de 144 Hz, sugerindo que taxas extremas são um nicho.

Importância do FPS para além da percepção

A taxa de quadros vai além da fluidez visual. Em jogos, ela impacta a responsividade. A 30 FPS, o atraso entre input e resposta na tela é maior, afetando gêneros dinâmicos como corrida ou tiro.

A 60 FPS, esse atraso diminui, e a 144 FPS, é quase imperceptível, beneficiando eSports. Além disso, taxas altas reduzem o motion blur em monitores com baixa persistência, como os OLED, mas exigem GPUs robustas para manter consistência.

Outro ponto é a estabilidade. Um jogo a 60 FPS com quedas frequentes para 40 FPS é pior que um 30 FPS constante, pois o cérebro nota variações bruscas mais que valores absolutos.

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Fonte: Reprodução

Tecnologias como G-Sync e FreeSync mitigam isso, sincronizando o monitor à GPU, mas não eliminam a necessidade de hardware capaz de sustentar o FPS alvo.

400 FPS é exagero?

Taxas acima de 60 FPS têm valor em nichos específicos. Para Esports, 144 ou 240 FPS em jogos oferecem vantagens mensuráveis em competições, onde cada milissegundo conta. Acima disso, como 400 FPS, o retorno é marginal.

Testes cegos mostram que até jogadores experientes confundem 144 FPS com 240 FPS em condições normais, e 400 FPS só se destaca em monitores de altíssima taxa (360+ Hz) e jogos ultrarrápidos.

O marketing de hardware, entretanto, empurra a narrativa de “mais FPS, melhor experiência”. Isso ignora a saturação perceptual e o custo-benefício. Em 2025, a busca por 400 FPS em jogos reflete mais status e fanatismo tecnológico que necessidade prática.

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Fonte: CDPR

A ciência explica por que quedas abaixo de 60 FPS são tão incômodas: o cérebro detecta facilmente variações que quebram a fluidez. Acima disso, os ganhos diminuem, limitados pela física da visão e pela tecnologia de exibição.

Taxas muito superiores a ela, embora impressionantes, são um luxo de nicho, impulsionado por GPUs caríssimas e monitores especializados, mas com impacto perceptual quase nulo para a maioria.

Para o jogador comum, 60 FPS em jogos, com capacidade estável e hardware acessível, oferecem a melhor experiência. As discrepâncias existem, mas nem sempre fazem diferença.

Você concorda com essa discussão sobre a taxa de quadros? Comente!

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