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O futuro dos consoles: há cada vez menos espaço para jogos novos?

Nova pesquisa indica que jogadores seguem gastando muito tempo em games do mainstream

por André Custodio
O futuro dos consoles: há cada vez menos espaço para jogos novos?

O mercado de consoles está em alta, com projeções animadoras: segundo o relatório PC & Console Gaming 2025 da Newzoo, as receitas devem alcançar US$ 52,4 bilhões até 2027, impulsionadas por GTA 6, o Nintendo Switch 2 e a consolidação do PS5 e Xbox Series.

Mas, enquanto o dinheiro gira, o tempo dos jogadores — o que realmente vale na indústria — está cada vez mais preso a uma porção de títulos dominantes. Novas ideias, sejam de grandes estúdios ou indies, enfrentam uma luta desigual e injusta por atenção.

Estaríamos diante de um futuro onde os consoles se tornam palco de franquias de longo prazo, com pouco espaço para o novo e para apostas que apostam mais em criatividade?

O poder das franquias

Hoje, jogar videogame muitas vezes significa girar em torno do mesmo núcleo de gigantes. Em 2024, apenas 10 jogos teriam concentrado 50% do tempo jogado, com Fortnite, Call of Duty, Minecraft, GTA V, Roblox e os títulos esportivos da EA e 2K dominando.

Esse “efeito jogo principal” revela um padrão: cerca de metade dos jogadores se dedica a apenas um a três títulos por ano, e mesmo os mais aventureiros raramente escapam do conforto das marcas mais conhecidas.

Como resultado, a hegemonia sufoca a inovação. Novas IPs, mesmo brilhantes, enfrentam uma barreira quase intransponível. Em 2024, Helldivers 2 (1,9% do tempo jogado no PlayStation) e Palworld (0,8%) conseguiram furar o bloqueio, mas seus números são modestos comparados a Call of Duty: Black Ops 6 (3,5%) ou EA Sports FC 25 (1,2%).

Helldivers 2
Fonte: Arrowhead

Esses raros sucessos dependem de marketing pesado, apoio de serviços como Game Pass ou PlayStation Plus e uma dose de sorte. Sem esses fatores, a maioria dos lançamentos naufraga e mesmo projetos muito criativos e surpreendentes podem ser ofuscado pelo de franquias mundialmente conhecidas.

A dependência de franquias também alimenta uma onda de remakes e sequências que nem sempre honram seus legados. The Last of Us Part I e Resident Evil 4 fazem os jogadores se lembrarem de cenários familiares, mas ao custo de, muitas vezes, ocuparem espaço do que poderia ser conceitos originais.

E quando as apostas em novas direções falham — como Concord ou Redfall, que prometeram muito e entregaram pouco (quase nada, no caso do multiplayer da extinta Firewalk) —, os estúdios voltam correndo para o terreno seguro. O resultado? Um ciclo de repetição que privilegia o lucro em detrimento da criatividade.

O grito da inovação em um mercado lotado

Enquanto os gigantes dominam o topo, os jogos indie lutam por oxigênio na base. Há uma década, títulos como Journey e Hollow Knight mostraram que pequenos estúdios podiam redefinir o que significa jogar. Hoje, porém, o cenário é implacável.

Com lojas digitais saturadas e algoritmos que favorecem o mainstream, a descoberta de novos jogos se tornou uma batalha desigual. Em 2024, indies como Balatro e Animal Well conquistaram destaque, mas dependeram de aclamação crítica e viralidade nas redes.

Para cada história de sucesso, há centenas de jogos de qualidade que nunca encontram seu público. Essa invisibilidade é devastadora: sem recursos para competir com o marketing dos AAA, muitos estúdios independentes fecham as portas, levando consigo ideias que poderiam refrescar a indústria. Para os jogadores, o custo é uma dieta criativa cada vez mais limitada.

O que os jogadores realmente querem?

Apesar do reinado de shooters, jogos esportivos e battle royales, há uma luz no fim do túnel. O relatório da Newzoo aponta que jogadores mais engajados, sobretudo no PlayStation, estão se voltando para RPGs e jogos de aventura. Títulos como Elden Ring, Final Fantasy XVI e Baldur’s Gate 3 provam que há espaço para experiências narrativas, imersivas e desafiadoras.

Essa migração é uma oportunidade. Enquanto o jogador casual pode se satisfazer com a rotina de EA FC ou Fortnite, existe um público crescente que anseia por mundos únicos e histórias de impacto. Para os estúdios, explorar esses gêneros menos saturados pode ser a chave para escapar da sombra das franquias anuais — mas exige visão, investimento e paciência para cultivar uma base fiel.

A verdadeira guerra onde cada segundo conta

No centro do problema está a disputa pelo tempo. Mais do que vender jogos ou consoles, as empresas lutam para manter os jogadores conectados. Em 2024, as receitas de console vieram de jogos premium (46%), microtransações (32%), assinaturas (16%) e DLCs (5%).

Jogos free-to-play, como Genshin Impact e Warzone, lideram o engajamento, mas sofrem com alta taxa de drop: muitos jogadores testam e logo abandonam. Para vencer, um F2P precisa de uma IP poderosa, gameplay viciante e timing impecável.

Warzone
Fonte: Activision

Serviços como Game Pass e PS Plus expandem o acesso, mas também criam um paradoxo: com tantas opções, os jogadores experimentam superficialmente, descartando títulos que não os prendem nos primeiros minutos.

Enquanto isso, os gigantes — com comunidades sólidas e atualizações constantes — continuam monopolizando as horas de jogo, mesmo que fãs critiquem o próximo Call of Duty, EA FC ou Assassin’s Creed. No fim das contas, a comunidade investirá nessas séries recorrentemente.

O mercado de games precisa de renovação: jogos novos são o caminho?

O cenário atual levanta uma questão incômoda: os consoles estão se tornando territórios exclusivos dos gigantes? A concentração de tempo em poucas franquias, a luta dos indies por visibilidade e a dificuldade de novas IPs apontam para um risco de estagnação criativa. Sem diversidade, os consoles podem virar vitrines de sequências e remakes, com pouco espaço para surpresas.

Mas nem tudo é desânimo. Fenômenos como GTA 6 podem redefinir o mercado, abrindo brechas para outros títulos brilharem. O interesse por RPGs e aventuras sugere que há um público sedento por inovação, ainda que minoritário.

Para os estúdios, o caminho é árduo, mas promissor: investir em ideias ousadas, trabalhar em gêneros menos explorados e construir comunidades engajadas. Para os jogadores, a tarefa é simples, porém poderosa: dar chance ao novo, seja um indie desconhecido ou uma IP inesperada.

Enquanto aguardamos o próximo grande boom no mercado de games, o futuro dos consoles depende de nós. Será um looping de franquias familiares ou um palco para novos clássicos? É uma pergunta que vale a pena ser feita.