Firewatch: Vale a pena?
Em meio a tantos jogos focados em multiplayer ou em aventuras mirabolantes, Firewatch chega com uma proposta singular, misteriosa que visa prender o jogador pelo seu estilo narrativo.
O jogo desenvolvido pela Campo Santo é muito mais do que uma experiência narrativa em vídeo games. Ele consegue prender o jogador não só pelo seu estilo narrativo, mas pela belíssima direção de arte, trilha sonora e principalmente pelo carisma dos dubladores e sua desenvoltura na atuação usando apenas suas vozes para dar o tom certo ao enredo.
Mas ainda assim, na fase em que chegamos na indústria, será que um jogo consegue se manter apenas focando na narrativa? Qual equilíbrio entre todas as outras características de um jogo de vídeo game, Firewatch consegue alcançar?
Senta que lá vem história.
Prólogo
Firewatch é um jogo no qual as decisões feitas pelo jogador terão impacto direto no rumo de tudo ao seu redor.
No início apenas com textos.
O jogo começa contanto a história de Henry e Júlia. Como eles se conheceram ainda em 1975, detalhes da vida conjugal e como Henry chegou a seu estado atual, aceitando um emprego de verão em uma floresta nacional chamada Shoshone, localizada em Wyoming, nos Estados Unidos.
Porém, todas as decisões são feitas pelo jogador. Como “cantar” Júlia? O que responder quando perguntado sobre filhos? Que cão adotar e qual seria o seu nome? Que pose Henry faria para que Júlia fizesse um nú artístico dele? E principalmente, como Henry agiria em uma situação adversa que viria a separá-los, mesmo que não quisessem?
Esta análise não entrará em spoilers do jogo. Portanto, muitas coisas ficarão em aberto propositalmente, para que a experiência de cada jogador não seja comprometida.
Depois de um início arrebatador com apenas textos e efeitos sonoros produzidos na medida exata para ambientar os jogadores, Henry decide aceitar o emprego e se isolar de tudo durante o verão, visto que não consegue lidar com a situação na qual se encontra em sua vida conjugal.
Durante o prólogo, intercalando entre os textos e as decisões do jogador, controlamos Henry saindo de seu apartamento e indo até a floresta a qual seria seu lar pelos próximos 3 meses.
Neste início, já nos adaptamos a jogabilidade, que não é algo tão misterioso assim. Como usar os itens, interagir com objetos e etc.
Por fim, chegamos à Two forks, a torre de observação de Henry. Neste ambiente temos o primeiro contato com sua chefe, Delilah, a única interação humana que temos durante todo o jogo e que se faz apenas pelo uso de um walkie-talkie.
E assim começa Firewatch.
Enredo
Firewatch conta a história de Henry passando seus dias de verão na floresta como uma espécie de segurança florestal.
Ele terá que lidar com os diversos tipos de problemas que possam surgir e, principalmente, “vigiar” o início de incêndios em sua área delimitada dentro da floresta.
Delilah, que fica em outra torre de observação, entra em contato com Henry através do rádio para passar informações e instruí-lo sobre como lidar com os problemas que aparecem.
Porém, como esta é a única forma de interação com outra pessoa, a relação entre eles vai se fortalecendo, independente das escolhas do jogador que também podem optar por responder somente o necessário, sem prolongar ou se aprofundar nos diálogos.
Com pitadas humorísticas e temperos de sarcasmo, Delilah e Henry criam uma relação e aos poucos vão se abrindo sobre suas vidas até que um novo mistério surge para abalar a recém-criada relação.
A partir daí, o jogo gira em torno de todo este mistério e quais são as atitudes a serem tomadas por Henry com o suporte de Delilah.
A verdade em torno de tudo isso envolvendo os dois vai se revelando conforme exploramos o mapa e encontramos novos eventos.
Jogabilidade
Firewatch não é sobre jogabilidade.
O jogo, guardadas devidas proporções, poderia até ser considerado um “walking simulator“.
Nele, seu único desafio será ir do ponto A ao ponto B, encontrando equipamentos e outros itens nas caixas de suporte espalhadas pelo mapa, ou até mesmo ao longo de sua jornada.
E isso é realmente um estímulo, visto que o jogador tem apenas uma bússola e um mapa de mão para guiá-lo. No mapa, o único ponto destacado é sua localização e as anotações que Henry faz conforme vai descobrindo novas observações. De resto, é tudo por sua conta.
Falar com Delilah através do Walkie-Talkie é uma mecânica simples e muito bem explorada. Utiliza-se o L2 e as opções de resposta aparecem, algumas tendo tempo para que sejam respondidas.
Caso o jogador encontre algum objeto ou nova localização, basta pressionar o L2 e um diálogo sempre extrovertido e irreverente com Delilah será iniciado.
A movimentação de Henry é bem lenta. Isso é um artifício compreensível do jogo, visto que o protagonista é um “quarentão” um tanto quanto acima do peso. Sobretudo quando é preciso usar a corda para rapel, que demora uma eternidade até tocar o chão. Assim como escalar pedras.
Mesmo que um botão possa ser utilizado para realizar uma corrida, que não é lá essas coisas, mas que sem dúvidas também faz parte da imersão.
Gráficos
Firewatch é uma obra de arte quando se fala de três características que foram lapidadas de forma mais do que competente: A narrativa envolvente e imersiva, sua direção de arte e a espetacular trilha sonora.
Toda a sua ambientação e os visuais proporcionados pelos locais do jogo são algo que deixam qualquer um boquiaberto.
Em certo momento, será possível adquirir uma câmera fotográfica. Com ela, o jogador poderá tirar até 18 fotos – um desafio, haja vista a vasta quantidade de belos locais.
Fica a dica: Todos devem tirar fotos.
Desde um pôr-do-sol em um lago, o amanhecer, uma tempestade se aproximando, ou a luz do luar, Firewatch prende o jogador pela sua belíssima junção de elementos visuais.
Entretanto, as quedas no framerate ofuscam um pouco o brilho da obra, assim como delays de renderização em alguns locais e corriqueiros serrilhados nas texturas.
Problemas
Como já pincelado, o belo trabalho artístico não é isento de problemas que podem irritar os mais perfeccionistas, reduzindo a imersão proporcionada pelos diálogos sempre envolventes.
Cansado da mesma rotina, ou com pressa de alcançar um ponto importante ou a ponto de resolver um mistério do jogo, o jogador optará por correr. Mas, o game “enrosca” em diversos momentos no início das passadas aceleradas.
Outro problema, este mais grave, diz respeito a navegação. É perfeitamente possível seguir por um caminho por onde o personagem claramente não poderia ter passado, tornando impossível o retorno ao ponto de origem. Neste caso é necessário reiniciar o jogo.
Por fim, o desaparecimento de objetivos fundamentais e alguns congelamentos inesperados somam pontos negativos em desfavor do game. Em certos momentos se faz necessário fechar o aplicativo e reiniciar o game, perdendo o progresso conquistado.
Trilha Sonora
A trilha sonora é o ápice de Firewatch.
Surgindo e saindo de cena de maneira eficaz, todo o trabalho sonoro do jogo faz com que o jogador se sinta na pele de Henry, experimentando aquela vida solitária, apenas com a companhia de uma voz feminina através de um rádio.
Durante todas as trilhas, é possível “ouvir” o silêncio da floresta. Perceber pássaros cantando, patos na lagoa e até o uivar do vento pelas folhas das árvores.
A cada novo local descoberto, uma música inspiradora toma conta do gameplay e auxilia na solitária experiência de Henry.
Isso também acontece nas soluções de mistérios e nas descobertas impactantes do enredo, quando uma tocante trilha sonora de suspense surge, mesclando com a confusa voz de Delilah, fazendo com que o jogador respire fundo, muitas vezes aflito e sem reação às situações.
O trabalho sonoro implementado em Firewatch será lembrado como um dos mais vistosos desta oitava geração.
Considerações Finais
Firewatch consegue mesclar de maneira primorosa uma narrativa envolvente, belo trabalho gráfico e uma trilha sonora primorosa, mas peca em alguns problemas de desenvolvimento e principalmente no desfecho de toda a história do jogo.
Não fossem esses pontos, o jogo facilmente poderia ser considerado uma obra de arte em todos os sentidos.
A forma como o enredo vai se destrinchando, a relação entre Henry e Delilah, assim como os pensamentos dele acerca de sua esposa, e todo o mistério envolvendo a trama do jogo, são freadas por um final que não atende as expectativas.
Ainda assim, todas as qualidades do título não podem ser apagadas pelos problemas e qualificam o game como uma obra muito interessante e certamente recomendada.